Entrevista
Design
Nome forte do design, curador Waldick Jabotá celebra amadurecimento brasileiro
"Você tem de ser original, verdadeiro, tem de estar com o seu ofício de uma maneira autoral, porque é isso que valoriza [o design] em todos os sentidos", defende Waldick Jatobá. | Patricia Amancio
Um dos principais nomes do design nacional, Waldick Jatobá chegou a este posto graças a uma trajetória dedicada ao fomento da criação brasileira. Economista por formação e colecionador de arte, móveis e peças de design, ele deixou a carreira no setor financeiro em 2008 para abraçar sua vocação como curador. Desde então, enfileira participações em iniciativas em prol do segmento, com destaque para a criação da MADE – Mercado Arte Design (feira de design da qual é diretor-criativo), a atuação como curador do Pavilhão Brasileiro na Bienal de Design de Londres, em 2018, e como integrante do Conselho Consultivo Internacional do evento no ano seguinte. Também ocupou a direção executiva do Instituto Bardi e dedica-se, atualmente, ao Instituto Campana e ao Estúdio Campana, como diretor-geral.
Firme defensor do poder transformador do design, Jatobá realizou palestra recente sobre o tema em Curitiba – durante a mostra "Ôda: a vida que queremos construir" – e conversou com HAUS com exclusividade. Num papo rápido, numa brecha da agenda, falou sobre o amadurecimento do mercado brasileiro de design na última década. Confira:
HAUS - A MADE completou em 2023 dez anos de trabalho pelo fomento e visibilidade do design brasileiro. Que leitura você faz do mercado desde 2013? O que evoluiu em termos de mercado e também de público? Como as pessoas consomem design hoje?
WJ - Eu acho que é um posicionamento que foi criado e que está crescendo. A cada ano, você vê um crescimento, seja no número de designers, seja no número de peças de design e nas formas com que eles [os criadores] buscam interpretar, vamos dizer assim, aquele material. É lento, porque é um assunto novo até mesmo no mundo, considerando que uma das primeiras feiras de design colecionável surgiu há 18 anos. Mas é muito positivo, muito orgânico.
É algo que, dentro de uma rede de apoiadores, de fomentadores (a Ôda é uma delas, assim como a MADE e outros eventos), vai aumentar. Tudo isso faz parte justamente de um amadurecimento – amadurecimento de processo, dos criadores, da própria indústria e do mercado.
Falando em indústria, o design autoral já achou um lugar nesse ambiente?
WJ - Sim, acho que está mais presente. Não é o ideal ainda porque, infelizmente, existe essa cultura da cópia, o brasileiro adora copiar. Está diminuindo, mas é uma cultura. Não sei se é para dizer "eu consigo mais barato", mas não é a mesma coisa. A partir do momento que você não tem o autor por detrás daquele trabalho, você já não tem a mesma coisa. Pode ser mais barato, pode ser de graça, mas não é a mesma coisa.
No design, no passado, as indústrias não arriscavam, não queriam ter um novo nome porque era jovem, ou porque o processo era novo, ou porque eles não queriam investir. Então, era muito mais fácil copiar. Isso já há uns bons 20 anos. Uma das grandes batalhadoras para esse mercado, principalmente aqui no Sul, no polo moveleiro, foi a [jornalista e crítica de design] Maria Helena Estrada, por meio da Casa Brasil. Ela botava isso muito presente: "Não pode copiar, você tem que ser autor, trazer o trabalho autoral". E a MADE pegou justamente esse caminho 12 anos atrás para poder mostrar que, seja na indústria, seja na sua oficina, você não copia. Você tem de ser original, verdadeiro, tem de estar com o seu ofício de uma maneira autoral, porque é isso que valoriza [o design] em todos os sentidos.
Sobre a valorização do design autoral, como surgiu o convite para a participação deste evento?
WJ - A Tici [Ticiana Martinez, da Ôda], eu já conheço há muitos anos. Quando ela teve a ideia de trazer esse tipo de design para dentro da Ôda, nós começamos a trocar ideias e ela foi uma das grandes desenvolvedoras aqui em Curitiba desse tipo de design. Na época, ela queria trazer algo que tivesse significado, foi atrás das peças que o Instituto Campana produz com algumas comunidades em São Paulo, de artesãos e de assistidos de ONGs, e começou a trazer esse tipo de objeto para dentro da Ôda. Desde ali, a gente fez uma amizade, por conta justamente dessa preocupação que ela tem de valorizar o design – esse tipo de design, esse tipo de emoção que a gente quer ter naquela peça.
Aí foi uma coisa natural: quando ela fez esse evento, que tem uma relação com a MADE, com o Campana e tudo mais, ela me convidou para vir e trocar ideias, falar um pouco do que eu acredito, do que eu gosto e da minha paixão. Não sou nenhum dono da verdade, eu só dou a minha opinião, mas em cima de um assunto que me emociona. Me convidou e eu estou aqui!
Você mencionou o Instituto Campana... há no design um papel social importante também. Como ele conversa hoje com o mercado brasileiro?
WJ - O design é uma das atividades que pode ajudar muito na transformação social, seja por meio de institutos como o Instituto Campana, que tem a missão de promover a transformação social através do design em comunidades carentes, ou de parcerias com ONGs e grupos de artesanato. Eu digo que o design é um dos grandes catalisadores disso, porque o designer pode agregar processos artesanais para enriquecer o trabalho que ele trouxe como criação. Então, é natural você ver não só institutos, mas também designers produzindo um de trabalho que tem por trás um apelo social.
Que é também esse lado transformador, ou outro lado transformador do design?
WJ - É outro lado transformador, é outro modo de posicionamento político. Eu acho que as pessoas não precisam levantar bandeiras para poder defender politicamente seus interesses e seus pensamentos. Você pode fazer de uma maneira muito silenciosa, desde que você o faça da maneira correta. Você pode fazer uma crítica social, se você apoiar uma comunidade social. Você pode fazer uma crítica política, se você estiver fazendo alguma coisa contra uma corrente política. Você não precisa levantar bandeira, você pode fazer de uma maneira verdadeira, sincera e própria.