Instituto Jaime Lerner
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Lentes positivas para pensar a cidade como solução pelo olhar do Instituto Jaime Lerner.
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O legado de Jaime Lerner: semeando mudanças
Jaime Lerner com Stephen Goldsmith. | Arquivo pessoal / Stephen Goldsmith
Repousa sobre minha escrivaninha a réplica em bronze de uma semente de Araucária que me foi presenteada por Jaime Lerner. É uma peça pesada, que se encaixa tão confortavelmente em minha mão que parece que a espremi de um pedaço de argila. A peça me faz lembrar do peso do legado de Jaime mundo afora.
Como vejo sua influência? Tendo tido o privilégio de trabalhar com estudantes em vários continentes, testemunhei as formas como a teoria de mudança de Jaime gera mais mudança. O amplo espectro de seus projetos transformadores segue nutrindo e inspirando respostas criativas. Sua vida como criador semeou uma nova geração de profissionais atentos aos desafios que identificam.
A cornucópia de suas criações está enraizada nas complexas ecologias da vida urbana. Seja nas tipologias da habitação, sinergias do transporte, projetos de parques e espaços públicos, soluções de gestão de resíduos integradas à criação de empregos, ou enfrentando os desafios de manejo das águas, seu dom de ver a interconexão da vida urbana segue frutificando.
Exemplifico. No oeste das Montanhas Rochosas dos Estados Unidos, um grupo de estudantes que aprendeu sobre as formas como Jaime concebia mudanças fundou uma ONG cuja missão é trazer rios urbanos canalizados de volta à superfície. Por meio de “agulhadas transformadoras”, como Jaime descreveu os atos de “acupuntura urbana”, práticas mais sábias de gestão das águas estão criando novos e celebrados espaços públicos. No Utah, onde este exemplo hoje brilha, três riachos urbanos que corriam subterrâneos agora fluem em uma margem do rio. Esse rio, que dividia dois lados da cidade, tem agora belas novas pontes que conectam bairros. Os detritos que antes se acumulavam em suas margens deram lugar a pessoas que lá se reúnem. Nossas espécies irmãs, replantadas, podem também exibir seu esplendor sazonal.
Na Índia, estudantes de arquitetura mapearam os movimentos de catadores que separam o lixo em uma montanha de resíduos para sua sobrevivência. Chamado de Chhav, o projeto aborda um desafio diário para os habitantes de Rajiv Nagar, um assentamento informal ao redor de um dos três principais aterros sanitários de Delhi. Observando cuidadosamente o contexto e a comunidade, os estudantes perceberam a falta de espaços abertos dignos. Assim como ao trazer riachos enterrados à luz do dia, ativar infraestruturas subutilizadas está agora criando lugares sombreados para estas pessoas terem um respiro do calor e da chuva implacáveis. Jaime poderia ter chamado isso de um ato de gentileza urbana; outra “agulhada” transformadora.
A maneira empática e compassiva de Jaime atender às necessidades dos cidadãos ampliou o caminho que profissionais podem seguir para ajudar a curar, reparar e transformar a cidade. Quando apresento aos estudantes seu trabalho e suas formas de trabalhar, compartilho ainda o ensinamento que Jaime ofereceu sobre “não fazer nada”. Não o tipo indolente de nada fazer, mas um tipo humilde de inação. A versão resumida da história é que os residentes de um bairro de Curitiba enviaram a ele uma petição solicitando que um plano da cidade não fosse implementado. Ao analisar a petição, ele percebeu que suas razões eram muito sábias. Ele imediatamente notificou o departamento de obras públicas, dizendo-lhes para “não fazer nada, com urgência!” No mundo da arquitetura e do planejamento, onde os profissionais marcam seu progresso pelo que deixam para trás, Jaime nos lembra que deixar nada para trás às vezes é o maior presente.
Entre os muitos presentes que Jaime nos legou, talvez o maior seja a maneira como ele semeou o caminho para que uma nova geração de profissionais atue com urgência e cuidado. Neste segundo aniversário de seu falecimento, lembro-me do provérbio: “Homens sábios plantam árvores sob cuja sombra nunca se sentarão”. Confio que Jaime esteja nos olhando hoje, sorrindo seu belo sorriso, vendo as flores nas muitas árvores que plantou em nosso mundo.
[Texto traduzido do original em inglês, que pode ser lido abaixo na íntegra]
Jaime Lerner’s Legacy: Seeding Change
Resting on top of my desk is a bronze replica of an Araucaria seed given to me by Jaime Lerner. It’s a hefty casting. It fits so comfortably in my hand it feels like I squeezed it from a lump of clay. The piece is a handy reminder of the weight of Jaimie’s influence around the world.
How do I assess his global influence? Having had the privilege of working with students in the United States, Europe, South Korea, Taiwan, Ethiopia, and India, I’ve witnessed the ways Jaime’s theory of change inspires more change. His broad landscape of transformative projects cultivate and inspire creative responses today. His life as a creator has seeded a new generation of practitioners to respond to the challenges they identify.
Jaime’s cornucopia of projects are naturally rooted in the complex ecologies of urban life. Whether within the ecologies of housing types, transportation synergies, park and public space design, waste management solutions with integrated job creation, or meeting the challenges of managing water, his gift of seeing the interconnectedness of urban life is giving life again today.
For example, in the Rocky Mountain West of the United States, a group of students who learned about Jaime’s ways of imagining change created an NGO whose mission is to bring buried urban waterways back to the surface. As a pinprick of change, or as Jaime described them, acts of urban acupuncture, wise water management practices are establishing new, celebrated public spaces. In Utah, where this example shines today, three urban creeks that converged underground now converge at a rivers edge. That river, which divided two sides of the city, has handsome new bridges to connect neighborhoods. The debris that once collected on its shores is now replaced by people who connect there safely. Our sister species can show off their seasonal splendor, too.
Across the pond to India, architecture students there identified a pattern of movement where ragpickers sort waste on a mountain of garbage for their survival. Named Chhav, the project addresses a daily challenge for the people of Rajiv Nagar, an informal settlement around one of Delhi’s three major landfills. By carefully observing the context and community, the students identified a lack of dignified open space. Just as with bringing buried creeks to the light of day, activating underutilized infrastructure is now creating shaded places for people to take respite from relentless heat and rain. Jaime may have called this an act of urban kindness; another pinprick of change.
Jaime’s empathic, compassionate way of attending to the needs of all citizens widened the path designers might follow to help heal, repair, and transform the places we care about. When I introduce students to his work and ways of working, I shared the teaching Jaime offered for doing nothing. This wasn’t about an idle kind of doing nothing, but an urgent kind of doing nothing. The short version of the story is that residents in a Curitiba neighborhood sent him a petition requesting that a city plan not be implemented. Upon reviewing their petition, he realized that their reasons were very wise. He immediately sent a notice to his public works department telling them to, “do nothing, urgently!” In the world of architecture and planning, where designers mark their progress by what they leave behind, Jaime reminds us that leaving behind nothing is sometimes the biggest gift.
Of the many gifts Jaime left behind, perhaps it’s the way he seeded the way a new generation of designers act with urgency, and care. On this second anniversary of Jaime’s passing, I’m reminded of the proverb: “Wise men plant trees under whose shade they will never sit.” I trust that Jaime is looking down today, smiling his beautiful smile, seeing blossoms on the many trees he’s planted in our world.
*Stephen Goldsmith: o trabalho interdisciplinar com cidades busca criar e transformar positivamente os lugares que nos interessam. Também artista, sua experiência inclui trabalho no setor público, na sociedade civil e na academia, defendendo a justiça social e ambiental em áreas como habitação social e projetos de espaços públicos, planejamento urbano e ecologia urbana.