Arquitetura

Urban Sketchers, os retratistas do tempo em ação em Curitiba

Flávia Schiochet
13/11/2016 17:50
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Sketch de Fabiano Vianna, na Sim Galeria

Em uma tarde gelada de sábado, cerca de 20 pessoas concentram seu olhar na Casa de Pedra, onde funciona a Galeria SIM, no Batel, e voltar sua atenção para o caderno em seu colo. Alguns improvisam um cavalete usando um tripé, uma prancheta ou o próprio muro, ficando de costas para a edificação. Nas mãos, grafite, pincel, marcadores, canetas. Desenham a casa de ângulos diferentes, compondo histórias e realçando detalhes: o tronco da árvore em frente, o padrão das pedras da fachada. O silencioso grupo é o Urban Sketchers, “croquizeiros” que se reúnem aos sábados à tarde, por duas horas, em locais diferentes. O grupo é espontâneo e combina pelo Facebook os endereços.
A Casa de Pedra foi o tema do 75º encontro dos desenhistas (amadores e profissionais), que já traçaram linhas para retratar o Jardim Botânico – em um encontro nacional que reuniu em Curitiba mais de 300 desenhistas –, um orquidário, o ensaio da orquestra sinfônica, uma fábrica de aviões, uma aula de balé. “Desenhar prédios e casas é mais comum porque é um exercício que arquitetos e artistas fazem. Tem coisas que a gente não conseguiu desenhar, como shopping. Mas não temos preconceito com os temas”, explica Fabiano Vianna, ilustrador e designer, um dos organizadores do Urban Sketchers Curitiba.
Ele descreve seu trabalho como uma crônica gráfica, fabulando histórias e incluindo personagens no cenário. Um de seus registros no caderno é a casa de vidro de Lina Bo Bardi, em São Paulo. No primeiro plano, colocou Lina sentada. “O sketch é um desenho rápido, um exercício, e quando estamos desenhando algo tão dinâmico como alguém dançando, é desafiador, porque toda hora mudam as posições”, diz Fabiano.

Experiência

Duas páginas do caderno de Sueli Baglioli reúnem pequenos desenhos de detalhes da Casa de Pedra. Ela começou a desenhar há três anos, quando foi a um encontro do Croquis Urbanos, outro grupo que reúne desenhistas nas manhãs de domingo. “Nos primeiros meses, saía de lá chorando”, brincou a administradora de 57 anos. Quem folheia seu caderno retangular não percebe que a experiência é tão recente. “Gosto dos detalhes do cotidiano. Desenho em bilhete de loteria, em convite de casamento, em tudo.”
Perto dela, o casal João Paulo de Carvalho, de 29 anos, e Ana Beatriz Artigas, de 25, levaram um tripé de fotografia para fazer as vezes de cavalete. Eles estudam e trabalham com artes, produzindo seus próprios cadernos, estojos e outros itens. “A gente prefere a aquarela por ser mais portátil, é fácil de levar para qualquer lugar e desenhar no caderninho, que seja. Mas no ateliê trabalhamos com todas as técnicas”, diz João. Ao redor, a aquarela é a técnica mais usada, mas há gente sentada nos muros e no gramado com grafite, marcadores, pincéis e canetas. Um rapaz se prepara para abrir o caderno e começar seu desenho. Do alto de uma das árvores, um passarinho faz sua contribuição com um excremento. “Ah, começamos com uma cagada”, brincou, enquanto limpava com um papel. E completou, arrancando gargalhadas: “É  que é um sketch mais orgânico”.

Início

O projeto Urban Sketchers começou em Seattle em 2006, quando o espanhol Gabriel Campanario passou a registrar as ruas de seu cotidiano para gravar itinerários. Começou a compartilhar no Flickr, rede social de fotografia, e seus amigos em Barcelona passaram a fazer o mesmo. E, como tudo na internet, disseminou-se rapidamente. Atualmente há grupos auto-organizados em dezenas de países e em várias cidades brasileiras. Quem frequenta os encontros nem sempre tem a profissão ligada ao hobby: são muitos arquitetos, artistas, designers e fotógrafos, mas também advogados, contadores e zootecnistas, com ou sem experiência. “O desenho é também uma forma de registro do tempo, de gravar algo antes que desapareça”, diz Fabiano. Casas de madeira são o principal exemplo desse tema: muitas delas continuam existindo apenas em papel algodão e aquarela.

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