Uma aventura em Curitiba

Cheguei a Curitiba em 2018 com o objetivo de fazer o doutorado em Gestão Urbana na PUCPR, graças à bolsa de estudos PEC-PG do CNPq¹. Vim atraída pela trajetória do planejamento urbano da cidade que teve destaque na Colômbia desde o início do século 21 com a implementação do Bus Rapid Transit – BRT, em Bogotá, o Transmilenio, que foi inspirado na proposta de transporte público curitibana. O conceito da Acupuntura Urbana, proposto por Jaime Lerner, ressoava também em meus pensamentos desde os tempos da graduação e vinha ilustrado pela lembrança de cartões-postais e relatos emotivos dos escassos viajantes.

Nos últimos anos, o interesse se ratificou com a admiração pelo trabalho dos professores curitibanos que conheci em Bogotá em eventos acadêmicos. Já nas vésperas da viagem, na despedida com a família, vim saber que meu tio-avô visitou Curitiba nos anos 1990 e relatou os avanços da cidade como parte do seu trabalho no governo da Colômbia. Assim, tinha boas razões para embarcar nesta aventura com marido e filho, sem saber quão dramática seria a situação do Brasil e do mundo nos anos posteriores.

Em Curitiba, tive uma intensa e estimulante experiência acadêmica que, devo dizer, superou as minhas expectativas. Muito se deveu à trajetória no planejamento e na gestão urbana dos docentes e colegas do programa de pós-graduação, tanto no tocante às atividades próprias da academia, como pesquisa e extensão, quanto ao exercício profissional de consultoria e na administração pública. Percebi, ademais, que o alto nível das universidades aqui está relacionado às estruturas institucionais e ao acesso a recursos para a pesquisa, inclusive em áreas como as ciências sociais aplicadas. Os orçamentos poderiam ser maiores e minguaram nos últimos anos, mas, mesmo assim, o Brasil sobressai nesse aspecto no panorama latino-americano.

Minha tese² de doutoramento abordou a necessária adaptação urbana às mudanças climáticas. Embora o meu objeto de estudo tenha sido as cidades médias andinas, os ensinamentos de Curitiba se revelaram indispensáveis e reforçaram os achados da revisão de literatura. A macrodrenagem como sistema estruturante do plano urbano para a diminuição de risco de enchentes e deslizamentos, com a possibilidade de aproveitamento das áreas verdes como espaço público (os parques de Curitiba!); e a descentralização dos serviços urbanos e espaços públicos, em especial aqueles dedicados à produção de água, energia e alimento, como as Fazendas Urbanas recentemente construídas.

Contrário ao acontecido com muitos planos comparáveis em outras cidades, as ideias propostas desde os anos 1960 vieram à luz graças ao idealismo, profissionalismo, compromisso e tenacidade do Grupo de Curitiba³, homens e mulheres que há décadas trabalham para construir a cidade sonhada, com a indiscutível liderança do arquiteto Jaime Lerner, e inspiram as novas gerações.

No fim da minha aventura em Curitiba, é uma honra escrever a coluna do Instituto Jaime Lerner, que cuida de um importante acervo de planos e projetos, verdadeiros tesouros que tenho a fortuna de consultar como parte da pesquisa pós-doutoral sobre ideias transformadoras pertinentes às cidades latino-americanas. Em abril de 2019, conheci pessoalmente o arquiteto Jaime Lerner, que recebeu uma turma do doutorado no Instituto Jaime Lerner. Disse que, de tudo o que fez, levaria consigo a Universidade Livre do Meio Ambiente. Agora eu levo também para sempre a lembrança dessa utopia realizada.

Vim a Curitiba, com minha família, em busca de um sonho de crescimento pessoal e profissional. Desejo, para esse ano que se inicia, que Curitiba possa continuar a ser a casa onde muitos sonhos se realizem, e que a cidade possa continuar a inspirar seus cidadãos e profissionais da área do planejamento.