O chafariz da Praça Zacarias é muito mais do que um ornamento na paisagem urbana. Testemunha do desenvolvimento da cidade, ele foi o primeiro encanamento de água da capital e fonte do líquido para gerações de curitibanos que nem sonhavam com o conforto de ter uma torneira dentro de casa.
Para conhecer sua importância, é preciso voltar à segunda metade do século 19. Neste período, o “abastecimento” das residências era feito pelos chamados aguadeiros, ou pipeiros, profissionais que recolhiam a água das bicas e olhos d’água e entregavam-na nas casas de quem podia pagar pelo serviço. Quem não dispunha de condições para tanto utilizava a água retirada dos poços perfurados no fundo dos quintais.
“Naquela época Curitiba tinha muitos olhos d’água”, explica Junio Ferreira, coordenador da área de patrimônio da Companhia de Saneamento do Paraná (Sanepar). Foi umas dessas nascentes que chamou a atenção do engenheiro Antônio Rebouças Filho (o mesmo que, com o irmão André, foi responsável pelos estudos e soluções técnicas da ferrovia que liga Paranaguá a Curitiba).
Ao passar pela fonte da Praça da Misericórdia (atual Praça Rui Barbosa), ele provou da água e propôs ao então presidente da Província do Paraná, Venâncio Lisboa, o encanamento dela até o antigo Largo da Ponte (atual Praça Zacarias) para que a população pudesse se abastecer. “Neste período a Praça Rui Barbosa era praticamente deserta. Captar a água ali e levá-la para um ponto de maior concentração urbana era uma forma de garantir sua qualidade”, aponta o coordenador.
Autorizada a obra, foram necessários seis meses de estudo para o desenvolvimento do projeto, que envolveu a aquisição de tubos de cobre no Rio de Janeiro e de torneiras vindas da Europa. O poste, sextavado, foi obra de um artífice local.
No dia 8 de setembro de 1871, o chafariz do Largo da Ponte foi inaugurado. Além de facilitar o trabalho dos pipeiros, Ferreira destaca que ele serviu como um instrumento de inclusão social, pois “possibilitou que todas as classes sociais tivessem um ponto de coleta d’água na cidade”.
E assim foi até o início do século 20, quando, após a inauguração do primeiro sistema de abastecimento de água de Curitiba, o chafariz foi assumindo sua atual função estética. “Em 1939, ele chegou a ser retirado da praça e levado ao Museu Paranaense [ainda no Batel, como forma de resguardar sua integridade]. A história oral aponta, no entanto, que muito provavelmente a parte de cima do chafariz [que era convexa] tenha sido o motivo de sua retirada, pois, para a igreja, ele representava um símbolo fálico”, conta Ferreira.
Em 1968, por determinações do ex-prefeito Omar Sabbag, o chafariz voltou à Praça Zacarias, mas sem tal “acabamento”. Desde então, mantém vivo um importante pedaço da história do abastecimento público de Curitiba e do Paraná.