Design mais humano
Feira de Milão 2020
Presidente de grande marca italiana de móveis propõe um “lar do mundo real com design utilizável, ético e sustentável”

Giuliano Mosconi, presidente da marca italiana Zanotta, uma das mais importantes do país. | Divulgação
Lar doce lar. A frase que banalmente é usada em objetos decorativos se transformou no slogan pós-Covid da Zanotta, uma das marcas de design mais tradicionais do "Made in Italy". A empresa, que participa do Fuorisalone.it, concentrou-se justamente em mostrar aos consumidores que o mundo do design está pronto para acolher suas necessidades domésticas, suas exigências, com peças de qualidade, sustentáveis e quase personalizadas.
"Em um momento tão delicado, percebemos que o ser humano é o centro do universo. Estamos caminhando para um novo Humanismo. Nossas casas voltaram a ser nosso refúgio, nosso ninho, e nos demos conta de que foi deixada para segundo plano", reflete Giuliano Mosconi, presidente da Zanotta. Ele atendeu a HAUS com exclusividade por telefone e fala ainda sobre o futuro do design, dos lançamentos da marca e da resiliência do setor diante da pandemia.

O que significa para uma marca tão importante como a Zanotta participar do primeiro Fuorisalone em versão digital? O que se perde e o que se ganha?
Esse é um pouco do nosso Salão do Móvel mesmo que em versão limitada, mas é o nosso evento. Nossa participação é uma demonstração da vontade de recomeçar. Ficamos parados muito tempo e para enfrentar um período de crise é preciso superar os obstáculos. E tenho certeza que conseguiremos. Perdemos é claro o contato pessoal, a espontaneidade, o olhar dos clientes, dos arquitetos e das empresas parceiras.
Fica faltando o toque, o cheiro e a emoção de ver de perto um novo produto. O ganho fica por conta da nossa resiliência, da autonomia, de poder contar a nossa história do nosso jeito. Somos mais livres no mundo digital. Em resumo: entre perdas e ganhos, a indústria do design mostrou mais uma vez a sua força.
A quarentena forçada - dois meses e meio - em quanto afetou a produção e o faturamento da Zanotta?
Foram setenta dias de produção interrompida, mas o nosso trabalho nos bastidores não parou. Nossa produção caiu 30%. Teremos uma perda econômica, em relação ao mesmo período do ano passado, em termos de faturamento, de 6 a 7 milhões de euros.
Mas, reforçamos nossos contatos e relações com outras empresas, com fornecedores e com nossos projetistas, tanto que estamos apresentando durante o Fuorisalone a coleção "“Back to Emotions" com peças que propõem a ideia de um lar do mundo real, com design utilizável, ético e sustentável. E ainda temos a reedição da coleção Mollino CM 2020, oito peças, uma homenagem a fantasia do grande arquiteto e designer torinês Carlo Mollino, conhecido valorizar as formas zoomorfas e linhas anatômicas em seus projetos.

Estratégias para o futuro. Em que modo a pandemia a relação da marca com o consumidor e o mercado? Haverá uma maior investimento na plataforma de e-commerce?
Acho que as nossas coleções espelham essa nova relação com o consumidor. Como disse antes, o ser humano se deu conta da sua importância. A casa, que para muitos era apenas um local para dormir, se tornou nosso único espaço seguro. O consumidor percebeu que muitos de seus móveis foram comprados por impulso sem que houvesse um porquê. Descobrimos também que mesmo em casa é necessário termos ambientes privados, que nem sempre a mesa da cozinha pode ser usada como escrivaninha e que um cadeira de boa qualidade é sinônimo de conforto. A Zanotta quer promover um design acolhedor e pessoal. Nossa intenção é sempre oferecer uma vasta gama de produtos que satisfaçam as exigências do nosso cliente. O e-commerce veio para ficar e estamos estudando investimentos pesados nessa área.
O tema da sustentabilidade é muito presente hoje no design. As empresas do setor investem sempre mais no uso de materiais recicláveis e processos que impactem menos no ambiente. Depois do coronavírus, o tema central será a qualidade e uso de mão de obra especializada?
Ser sustentável é uma obrigação no setor e mais do que nunca é preciso pensar na sustentabilidade social que vai além do uso do material reciclado. A economia circular está aí para nos ajudar, é uma alternativa atraente que busca redefinir a noção de crescimento, com foco em benefícios para toda a sociedade. E o design deve seguir essa linha. Não só de reciclar mas de transformar o que já foi produzido. A qualidade deveria ser considerada uma característica inerente a qualquer produto assim como o uso de mão de obra especializada, seja ela artesanal ou industrial.

A pandemia mostrou que a globalização tem suas vantagens e desvantagens. Basta analisarmos o caso da China. O senhor acha que esse seria o momento para que algumas empresas italianas voltem a investir na produção local?
Não só acho como devem. A Zanotta produz 100% em território italiano até mesmos pequenos componentes. Tenho a impressão de que o mercado seguirá esse caminho de valorização do chamado savoir-fare. O próprio consumidor também está mais consciente, comprando o que realmente lhe serve. A tendência é não seguir as tendências. Investir em um design que seja consciente, sustentável, de qualidade e solidário. Em relação à China, vejo que as novas gerações - e falamos de consumo - admiram o Made in Italy e até o enaltecem nosso know-how mais do que nós mesmos. Muitos designers daquele país almejam desenhar produtos para nossas empresas pois sabem que somos os melhores. É hora de olharmos para o nosso próprio umbigo.
Qual o futuro do design "Made in Italy"?
Sou otimista. Vejo um futuro positivo à nossa frente. Temos história, capacidade, experiência e criatividade de sobra para enfrentarmos qualquer crise. Está no nosso sangue, faz parte do nosso DNA. O design internacional busca sempre novos horizontes em território italiano. Os designers - de todo o mundo- sonham em trabalhar para nossas empresas pois sabem que aqui é o berço da criatividade, inovação e até mesmo loucura. Só aqui podem dar asas à imaginação.