Indústria de móveis

Feira de Milão 2020

O design italiano renasce depois de dois meses em quarentena

Fernanda Massarotto, especial para HAUS
08/05/2020 19:24
Thumbnail

Ambientação com cadeiras A.I., da Kartell. | Divulgação

Bentornato #MadeinItaly! (Bem-vindo novamente #MadeinItaly). A frase lançada pela Federlegno Arredo, Federação das Indústrias do Setor de Móveis e Decoração da Itália, na última segunda-feira (4), comemora a volta do design italiano depois de uma quarentena forçada devido à pandemia que assolou (e ainda faz vítimas) o país e o mundo.
Uma data histórica para 74 mil empresas e 313 mil funcionários que movimentam por ano 42,5 bilhões de euros. "Sentir novamente o cheiro da madeira é impagável", descreve emocionada Veronik Romanutti, diretora de comunicação e marketing da Billiani, uma tradicional marca de cadeiras em madeira, fundada em 1911, na cidade de Manzano, na região do Friuli Venezia Giulia, no norte da Itália. A empresa familiar adaptou a sua linha de produção seguindo as rígidas normas de higiene impostas pelas autoridades governamentais.
Operária da Billiani volta ao trabalho na linha de produção.
Operária da Billiani volta ao trabalho na linha de produção.
Os 23 empregados que montam, pintam, envernizam e revestem as peças de madeira continuaram a usar máscaras, adotaram o distanciamento social e agora se revezam em turnos. O mesmo vale para o uso dos vestiários e do refeitório. "Temos energia e vontade para vender. Nosso produto é 100% feito no território com a colaboração de artesãos internos e externos. Usamos só madeira certificada europeia e de primeira qualidade como rovere e freixo. Esse é o diferencial e a força dos nossos móveis", enaltece a italiana, que também é casada com o Luigi Billiani, arquiteto, presidente e neto do fundador da marca.
O desejo de recomeçar é grande, principalmente nas regiões do norte e centro da Itália onde está a maioria das pequenas, médias e grandes empresas do setor. E não só. A cadeia produtiva ainda inclui laboratórios e ateliês de artesãos, o chamado terceiro setor, uma colaboração fundamental que faz do design "Made in Italy" uma importante fonte de renda nacional.
Produtos da marca Riflessi
Produtos da marca Riflessi
Em Ortona, na região central do Abruzzo, a Riflessi, com 34 funcionários começou a pensar no retorno às atividades há duas semanas. "Tudo é feito aqui com matérias primas selecionadas. E assim, entramos em contato com os fornecedores com antecedência. Isso ajudou a retomada da produção no primeiro dia da reabertura", explica o presidente da empresa Luigi Fammiano que aplicou um rigoroso protocolo de prevenção para garantir a saúde de todos os colaboradores. "Compramos máscaras, medimos a temperatura logo na entrada, disponibilizamos dispensers de gel antisséptico em todas as áreas e em cada área produtiva permitimos somente a presença de 3 pessoas".

Retomada "Made in Italy"

Confiança e resiliência são as palavras de ordem encontradas por Lorenza Luti, diretora de Marketing e Retail da Kartell, um das mais famosas marcas do "Made in Italy", com seus móveis de "plástico", expressão máxima do chamado design democrático. A sede da empresa, em Noviglio, nos arredores de Milão, ficou fechada durante mais de 40 dias de "lockdown" mas a equipe de criação, marketing e comercial continuaram em ação. "Nestas últimas semanas, nossas ideias, nossa criatividade e nosso diálogo com os designers não se curvaram ao vírus.
Ambientação com cadeiras A.I., da Kartell.
Ambientação com cadeiras A.I., da Kartell.
Trabalhamos com o intuito de oferecer experiências inéditas com o recurso dos serviços online e dar assistência ao cliente", conta a herdeira da Kartell, filha de Claudio Luti (confira entrevista exclusiva), também presidente do Salão do Móvel, o maior evento do setor, que este ano acabou sendo cancelado. "Assim que as lojas abrirem, no próximo dia 18 de maio, o foco será em produtos inovadores e sustentáveis como a cadeira A.I, desenhada com ajuda de inteligência artificial e com material reciclado. Sem falar, nas novidades para o Natal."

Lar doce lar com estilo   

A pandemia forçou milhões e milhões de pessoas ao confinamento. E com isso veio a valorização dos ambientes. A estética e funcionalidade de móveis e peças de decoração foram colocadas à prova e re-avaliadas. O design, mais do que nunca, foi protagonista. Há quem já pense na troca do sofá pouco confortável ou então planeje um espaço para criar um home office mais eficiente. "Depois de muito tempo, a casa voltou a ser nosso microcosmo, por escolha ou necessidade. E isso demonstra que temos de pensar também ao quesito arquitetônico, ou seja, prédios residências mais  confortáveis, com áreas de lazer e de baixo impacto ambiental", alerta o arquiteto Vittorio Grassi, fundador do escritório VGA, em Milão.
O arquiteto Vittorio Grassi
O arquiteto Vittorio Grassi
O italiano, assim como seus colegas de profissão e designers, não pararam. Munidos de máscaras e mantendo a distância social continuaram a pensar em fórmulas criativas para enfrentar o que agora chamamos de "new normal" ou seja, a nova normalidade. "Foi um período muito difícil. Principalmente do ponto de vista econômico, mas mais do que nunca foi um período de reflexão. Aprendemos até a explorar e apreciar alguns cantos de nossas próprias casas. E reconhecer a qualidade do bom design", diz.
E é justamente o design exclusivo, o know-how artesanal, a matéria-prima de qualidade, critérios sustentáveis e o uso da mão de obra local que fizeram da Itália um dos mais importantes pólos de produção do setor. "O reconhecimento e notoriedade do Made in Italy é a nossa melhor propaganda. É preciso enaltecê-la", diz Veronik Romanutti, da Billiani, que desde 1997, ao lado do marido, vem investindo no que ela chama de design funcional.
As peças da marca, mais de 200 no total, são todas feitas na região seguindo a tradição dos fundadores e decoram projetos de interiores na França, Alemanha, Inglaterra e Austrália. "Prezamos pela qualidade e funcionalidade. A inovação ficou por conta do uso da cor e revestimentos em tecido além da colaboração de designers conceituados", esclarece a diretora de comunicação e marketing que conta com a direção artística de Cristina Celestino.
A mesma opinião é compartilhada pelo presidente da Riflessi, conhecida pelo seu catálogo de produtos personalizados em madeira e cerâmica e trabalhados manualmente "O governo tem o dever de tutelar as empresas que honram o Made in Italy. Mais do que nunca, é preciso investir em criatividade, experiência, pesquisa e acabamentos, elementos que estão e já se encontram no nosso DNA", reflete o empresário que espera ver o retorno de muitos colegas do setor ao território italiano.