Quem foram as mulheres da Bauhaus? Os principais nomes femininos da influente escola alemã
Foto: Arquivo/Bauhaus
Cabelos curtíssimos ou raspados. Roupas diferentes. Dietas vegetarianas. Saber pintar, esculpir e tocar sax. Participar de festas do meio artístico. Há 100 anos as jovens estudantes mulheres da Bauhaus – a lendária escola alemã de design – pareciam ser tão empoderadas quando as jovens mulheres de hoje.
É o que as fotografias de época do Museu da Bauhaus e do Arquivo Público Walter Gropius (1883-1969) revelam.Mas não acredite no que vê. Quem planta a dúvida é a filósofa Ulrike Müller, que se debruçou sobre o tema e escreveu a respeitada obra “Mulheres da Bauhaus” (2009). A escola foi uma das primeiras do mundo a aceitar pessoas do sexo feminino, que foram maioria na instituição em seu início em 1919, totalizando 84 mulheres e 79 homens. Gropius, seu fundador, garantiu que não haveria “diferença entre o sexo belo e o sexo forte”.
Então por que seus filhos homens são celebrados como titãs (com razão!) até hoje, como é o caso de Paul Klee, Wassily Kandinsky, Mies van der Rohe e Marcel Breuer, e os nomes de suas filhas igualmente brilhantes não nos parecem tão impressionantes, como é o caso da mestra tecelã Gunta Stölz, da arquiteta Lilly Reich, que por anos ajudou Van der Rohe em seus projetos; da designer Anni Albers, a primeira mulher a receber o diploma da Bauhaus; e da criadora de móveis e brinquedos infantis Alma Siedhoff-Buscher, uma das poucas a participar dos workshops de escultura?
Escanteadas para a tecelagem
O esboço de uma resposta vem da historiadora e curadora de design para algumas das galerias mais famosas do mundo – como a milanesa Nilufar e a britânica Serpentine Gallery –, a inglesa Libby Sellers. Ela escreveu o livro “Mulheres do Design” (2018) e explica que isso ocorria “por medo do impacto que a presença feminina teria sobre a reputação profissional dos cursos de arquitetura e design industrial perante os olhos das indústrias, já que a intenção era produzir as peças em massa”.
Por isso, o ingresso das mulheres começou a ser paulatinamente dificultado e elas começaram a ser escanteadas para as aulas de tecelagem, arte considerada menor na época, quisessem ou não. “Jovens brilhantes eram atraídas para Bauhaus sonhando em ser arquitetas. E só depois eram informadas de que tecelagem era a única disciplina apropriada para as mulheres”, como resume a companhia britânica de tecidos e tapetes Christopher Farr em texto oficial da exposição sobre Anni Albers no Tate Modern, em Londres, que segue até 27 de janeiro de 2020.
Isso acontecia por diversos motivos. Klee e Kandinsky associavam genialidade e criatividade somente à masculinidade, e Gropius tinha convicção de que as mulheres não tinham capacidade para lidar com
problemas que envolvessem tridimensionalidade (3D). O fundador da Bauhaus via o mundo com tamanha separação de gênero que chegou a postular que o vermelho e o triângulo eram símbolos masculinos e que o azul e o círculo eram elementos puramente femininos.
problemas que envolvessem tridimensionalidade (3D). O fundador da Bauhaus via o mundo com tamanha separação de gênero que chegou a postular que o vermelho e o triângulo eram símbolos masculinos e que o azul e o círculo eram elementos puramente femininos.
Apesar da dificuldade gigante, algumas conseguiram conquistar fama já naquela época e foram reconhecidas por seus pares masculinos. Mas a maior parte das integrantes mulheres da escola começou a receber a atenção merecida somente há alguns anos, graças às novas abordagens da história. Conheça um pouco mais sobre algumas delas:
Katt Bott
Foi a primeira arquiteta da Bauhaus. Depois de cursar a escola em Dessau, trabalhou no escritório de arquitetura dos irmãos Luckhardt, em Berlim, sendo finalmente contratada por Otto Haesler em 1929. “Não aprendemos nada na Bauhaus. O que fizemos foi solidificar nosso caráter”, comenta a arquiteta em artigo publicado na revista alemã Deutschland.
Friedl Dicker-Brandeis
A austríaca foi discípula de Johannes Itten e estudou tecidos, impressão e encadernação. Junto de Franz Singer, projetou mobiliários inovadores para apartamentos, usando móveis mutáveis e cheios de truques. Em 1942, foi deportada para Theresienstadt, na República Tcheca. Ainda existem mais de 5 mil desenhos preservados que ela usava nas aulas para encorajar as crianças do gueto em que morava. Foi assassinada em 1944, em Auschwitz.
Lotte Stam-Beese
Arquiteta e planejadora urbana que participou do projeto de reconstrução de Roterdã, na Holanda. Interrompeu seu estudo na Bauhaus em 1929 e percorreu a Europa em busca de trabalho como projetista. Conquistou seu diploma de Arquitetura em Amsterdã com 41 anos, começando oficialmente sua carreira na área.
Marta Breuer
Alemã de Frankfurt e ex-aluna da Bauhaus, foi a primeira esposa de Marcel Breuer, um dos nomes mais proeminentes do design. Depois do divórcio, veio ao Brasil e tornou-se desenhista profissional em São Paulo. Trabalhou com o oftalmologista Archimede Busacca e na Escola Paulista de Medicina, com André Dreyfus, um dos organizadores da USP.
Era tão importante a compreensão dada pelo seu detalhamento gráfico que ela assinou vários estudos como coautora, como os de citogenética ao lado de Crodowaldo Pavan. No Departamento de Biologia da USP, deixou móveis que ela mesmo fabricou. Faleceu em 1977, em São Paulo, naturalizada brasileira.
Marianne Brandt
A artista e designer de metal ainda era estudante quando projetou, em 1924, bules de extrato de chá, feitos de latão e ébano. A peça se tornou um dos ícones da Bauhaus. Em 1928 assumiu a direção da oficina metalúrgica da escola. Para o artista László Moholy-Nagy, ela era a melhor e mais genial estudante da escola.
Ise Frank Gropius
Esposa do fundador da Bauhaus, Walter Gropius, Ise chocou a sociedade da época por ser da alta burguesia e trabalhar. Sua contribuição foi decisiva, pois era ela quem cuidava dos negócios, organizava e fazia a divulgação dos projetos.
Lilly Reich
Foi parceira de vida e de profissão de Mies van der Rohe. Sua influência no trabalho do arquiteto é frequentemente esquecida. Foi responsável pelo design de interiores dos projetos de Mies. Pesquisas
recentes da historiadora alemã Christiane Lange indicam que a icônica Day Bed na verdade foi desenhada por Lilly, pois a primeira versão da peça foi publicada em 1932 com seu desenho e assinatura.
recentes da historiadora alemã Christiane Lange indicam que a icônica Day Bed na verdade foi desenhada por Lilly, pois a primeira versão da peça foi publicada em 1932 com seu desenho e assinatura.
Após a guerra, Lilly Reich ensinou concepção de interiores e teoria da construção na Universidade de Berlim e reabriu seu escritório de design e arquitetura onde trabalhou até sua morte em 1947.
Anni Albers
De origem judaica, Annelise Fleischmann entrou para a Bauhaus em 1922 com a intenção de estudar pintura, mas foi obrigada a se satisfazer com o ateliê de têxteis. A arte abstrata teve grande influência em seus tecidos pictóricos. Ela foi a primeira artista feminina têxtil a ter uma exposição individual no MoMA, em Nova York.