Estilo & Cultura
Edifício Garcez 90 anos: conheça o interior “escondido” do ícone da XV
Por dentro, escadas rolantes denotam a passagem do tempo. Foto: Hugo Harada/Gazeta do Povo | Gazeta do Povo
A famosa fachada na esquina da Avenida Luiz Xavier com a Rua Voluntários da Pátria, ao lado da Praça Osório, demonstra a importância histórica daquele que foi o terceiro edifício mais alto do Brasil, depois do Martinelli, em São Paulo, e do edifício do jornal “A Noite”, no Rio de Janeiro. Construído entre 1927 e 1959, o projeto do engenheiro e ex-prefeito de Curitiba, João Moreira Garcez, consolida a área central da cidade e evoca o crescimento econômico da época.
O edifício Garcez marcou o início da verticalização de Curitiba, junto com o Palácio da Avenida. “Essa arquitetura tem um tom de moderno, da busca pelo racional e funcional, o que também era uma característica do modo de vida no Brasil da década de 1920”, comenta o arquiteto Jeferson Navolar, presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Paraná (CAU/PR).
O projeto original previa cinco andares, mas a versão final do edifício ficou com oito andares. No livro recém-lançado Prédios de Curitiba, Guilherme de Macedo mostra que os cinco primeiros andares foram inaugurados em 1933, o sexto em 1937 e o oitavo andar apenas duas décadas depois. Macedo atribui essas ampliações a uma lei que oferecia dedução tributária para o prédio mais alto da cidade, um incentivo à verticalização.
Em constante metamorfose, o edifício Garcez foi construído com a intenção de ser um hotel de luxo, mas se tornou um grande prédio empresarial e chegou a funcionar como shopping center, consulado da Alemanha nazista e sede da Federação Paranaense de Futebol.
Além da fachada
A cor bruta do cimento predomina na antiga e famosa fachada do edifício Garcez, mas na parte interna as paredes claras e os diversos computadores demarcam as mudanças feitas ao longo do tempo. A primeira reforma foi realizada pelo grupo Hermes Macedo para, em 1988, reinaugurar o local como Shopping Center Garcez. Hoje o prédio é ocupado pela Uninter e foi novamente se adequando às necessidades de uso e às novas exigências dos bombeiros.
O arquiteto Jeferson Navolar passeia pelo edifício e aponta alguns elementos originais: vitrais geométricos, guarda corpos e esquadrias. Ele comenta que os ambientes eram maiores no projeto de Garcez e, possivelmente, foram divididos durante a reforma do shopping.
Escadas rolantes foram instaladas onde originalmente era um pátio aberto. O arquiteto lembra que eram comuns esses espaços de circulação de ar nas construções do Brasil da década de 1920, especialmente por normas sanitaristas. Apesar de inovador para Curitiba, o pátio aberto era normal em construções de São Paulo, onde Garcez cursou engenharia civil.
Garcez, o engenheiro
“Jamais deveis pretender e muito menos aceitar posições ou funções nas quais a vossa passagem não fique marcada por atuação de inequívoca afirmação da vossa personalidade”, disse Garcez em longo discurso de paraninfo durante colação de grau da turma de engenheiros civis, em 1945.
Manoel Pedro Lima acredita ser um discurso que define bem o perfil do ex-prefeito de Curitiba. Aos 80 anos, Lima relembra os tempos em que visitava o avô, grande amigo de Garcez. Conta que a relação de Garcez e Eduardo Santos Lima era de muita proximidade, com ligações e visitas constantes.
A casa de Eduardo, avô de Manoel, foi projetada por Garcez em 1937 e hoje é a sede da Fundação Santos Lima. “Ele era um detalhista como pouca gente”, diz Manoel, mostrando que as portas da casa foram colocadas em 135 graus (ao invés da comum angulação de 90 graus), evitando que as portas batam com o vento.
Sem esconder a admiração, Manoel fala que Garcez era perfeccionista e conta que o então prefeito pegava a marreta e desmanchava os trechos que considerada irregulares no asfalto da Rua XV de Novembro. Ele também não esconde seu descontentamento com o edifício atual. “Mutilaram o prédio, descaracterizaram”, opina.
Manoel Pedro Lima define Garcez como ”um homem a frente de seu tempo”. Na arquitetura, Jeferson Navelar não o enxerga como vanguardista, mas como alguém atualizado com o estilo de construções de São Paulo, por sua vez inspirado no estilo europeu vigente na época.
Especial para Gazeta do Povo.