Estilo & Cultura

Com linhas contínuas e instalações escultóricas, pintor curitibano conquistou o mundo

Luan Galani
23/11/2018 09:58
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Foto: Letícia Akemi | Leticia Akemi

Pintor dos bons. A frase que estampava a caixinha de madeira de lápis coloridos de André Mendes — na época um guri de seis anos — ainda é o que melhor descreve o artista. Aos fatos: o curitibano de óculos vermelhos foi procurado pelo hotel de luxo Andaz Singapore, a nova joia arquitetônica de Cingapura, para assinar quatro obras gigantes, e recentemente foi convidado para uma exposição individual no Centro Cultural Cloître des Billettes, um mosteiro desativado no coração de Paris, considerado pelo especialista francês em história da arte Marc Soleranski o mais antigo claustro preservado da cidade (datado de 1427) e um famoso destino de peregrinações cristãs da Idade Média.
Foto: Letícia Akemi/Gazeta do Povo
Foto: Letícia Akemi/Gazeta do Povo
Essa última intervenção artística revela muito sobre André, agora com 39 anos. Demarca de uma vez por todas uma fase mais ousada e experimental de suas obras. Mostra de forma escancarada que as pinturas de linhas contínuas e gestos rápidos, e as formas orgânicas com cores vibrantes — duas de suas marcas registradas — viraram outra coisa. Transbordaram para além das telas e ganharam vida tridimensional em ferro, espumas, tecidos e resinas, entre outros materiais. Viraram instalações escultóricas para criar interações arquitetônicas.
A mostra em terras francesas também delata o compromisso pessoal do artista por um mundo melhor. Parece piegas, mas é a marca dos bons. Ele não larga o osso. Deseja que as pessoas reflitam sobre os espaços, mas lá no fundo também guarda uma esperança de que consiga despertar uma dose maior de sensibilidade para fazê-las repensar suas existências e a essência do ser humano. De maneira bem prática: que cidade queremos ter? Que tipo de vida queremos viver? O que preciso mudar para ser melhor?
Foto: Sami Korhonen
Foto: Sami Korhonen

Interlux Arte Livre

André nunca ficou só na conversa. Depois de passar um tempo na Austrália, de cursar Design Gráfico pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná em 2003 e de fazer especialização em desenho artístico pelo Institut Superior de Diseño y Escuela de la Imatge IDEP em Barcelona, na Espanha, resolveu se juntar ao coletivo artístico Interlux em 2006. O grupo de jovens inquietos fez história em Curitiba. Não só criaram alternativas ao circuito oficial de arte para apresentar seus trabalhos, como também construíram uma abordagem provocadora de repensar a sociedade e a cidade com intervenções plásticas, ações performáticas e reocupação de espaços urbanos. O time tinha Celestino Dimas, Goura Nataraj, Juan Parada, Rimon Guimarães e Tiê Passos, para citar alguns.
Foto: Mariana Aeres Fotografia
Foto: Mariana Aeres Fotografia
Trouxeram a monja Coen para plantar árvores no Juvevê. Pintaram uma ciclofaixa que deu o que falar. Transformaram a carcaça de um Fusca em arte. Deram cara nova às galerias subterrâneas do transporte público da cidade.

Ateliê e casa

Em um galpão próximo ao estádio do Atlético, André divide o ateliê com o renomado fotógrafo Antonio Wolff. E a estátua de uma vaca, o que sobrou de uma exposição coletiva antiga. Faz experimentações por todos os lados do terreno e mantém um caos organizado, como ele mesmo descreve, dentro de uma casinha de madeira vizinha ao barracão principal.
Lá dentro confidencia à reportagem que até os 17 anos queria ser médico ou dentista. Só largou mão da ideia depois de a família sugerir que ele abraçasse o desenho e a pintura, atividades que ele sempre havia visto como hobbies. Estava no sangue. Afinal, a mãe, Yara Mendes, é decoradora de prestígio e o tio, Jair Mendes, luz das artes do sul do Brasil.
Foto: Letícia Akemi/Gazeta do Povo
Foto: Letícia Akemi/Gazeta do Povo
Hoje, logo na entrada do apartamento do artista, uma grande tela de Jair recepciona os visitantes. André é casado com a psicóloga e pesquisadora de conteúdo eco cool Priscyla Alma e pai de duas meninas: Celeste, 7, e Alice, 4. O lar do quarteto é fantástico. O charme, simplicidade e personalidade estão em todos os cantos, dos objetos cheios de história até aos mantras colados na geladeira. As paredes são uma galeria para artistas que a família admira. Os quadros mudam de lugar conforme o humor dos donos da casa. O piano e a estante de livros têm lugar de destaque na sala de estar, junto de um tapete assinado por André para uma mostra de decoração. Sua obra favorita está no quarto do casal. Não tem nome. Vez e outra as filhas pedem e a família se junta para pintar as paredes do dormitório delas. A paisagem sempre muda.

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