Estilo & Cultura

Museu a céu aberto completa 10 anos aliando arte e paisagismo

Mariana Domakoski*
17/11/2016 16:54
Thumbnail

A natureza, com lago e palmeiras, faz uma moldura exuberante para a obra “Penetrável Magic Square #5”, de Hélio Oiticica. Foto: Rossana Magri/Divulgação | Rossana Magri

Perder-se em um jardim exuberante, obras de arte que propõem a reflexão e estruturas arquitetônicas de tirar o fôlego. Esse pode ser o cenário ideal para um dia completamente relaxante, que permite a admiração da beleza em suas mais variadas formas. Essa é justamente a atmosfera que o Instituto Inhotim, em Minas Gerais, proporciona a seus visitantes.
“Beam Drop”, de Chris Burden, recria uma obra de 1984 e é performática: durante 12 horas, um guindaste de 45 metros de altura lançou as 71 vigas  em uma poça de cimento fresco. Foto: Eduardo Eckenfels/Divulgação
“Beam Drop”, de Chris Burden, recria uma obra de 1984 e é performática: durante 12 horas, um guindaste de 45 metros de altura lançou as 71 vigas em uma poça de cimento fresco. Foto: Eduardo Eckenfels/Divulgação
Antes de 2006, o jardim botânico e centro de arte contemporânea localizado em Brumadinho, distante 60 quilômetros de Belo Horizonte, e criado pelo empresário mineiro Bernardo Paz, era privado. Tratava-se de uma fazenda de Paz, em que ele começou a dar vazão ao hobby de cultivar plantas e aprender sobre botânica depois de uma viagem a Acapulco, no México, onde viu um evento realizado em um jardim, com a presença de uma orquestra tocando em meio à natureza. A união da música com o entorno natural e as pessoas aproveitando a festa inspiraram o empresário a criar um jardim em sua fazenda.
Estrutura externa da instalação “De Lama Lâmina”, de Matthew Barney: um domo geodésico em aço e vidro localizado em uma das matas afastadas e densas do complexo. Foto: Daniela Paoliello/Divulgação
Estrutura externa da instalação “De Lama Lâmina”, de Matthew Barney: um domo geodésico em aço e vidro localizado em uma das matas afastadas e densas do complexo. Foto: Daniela Paoliello/Divulgação
Internamente, um trator florestal e uma escultura de árvore em polietileno representam o conflito entre o orixá do ferro e guerra e o orixá das florestas e força da natureza. Foto: Pedro Motta/Divulgação
Internamente, um trator florestal e uma escultura de árvore em polietileno representam o conflito entre o orixá do ferro e guerra e o orixá das florestas e força da natureza. Foto: Pedro Motta/Divulgação
Um dos amigos pessoais do empresário, o paisagista brasileiro consagrado mundialmente Roberto Burle Marx encantou-se pelo complexo que estava se formando e, durante várias conversas informais, trocou figurinhas com Paz sobre o paisagismo do local. As influências de Burle Marx aparecem em vários momentos, como nos maciços de plantas que inundam de cores e na preferência pelo uso de espécies tropicais.
Os sons produzidos pela terra a 200 metros de profundidade podem ser ouvidos dentro do “Sonic Pavilion”, criado por Doug Aitken. Foto: Daniela Paoliello/Divulgação
Os sons produzidos pela terra a 200 metros de profundidade podem ser ouvidos dentro do “Sonic Pavilion”, criado por Doug Aitken. Foto: Daniela Paoliello/Divulgação
A construção dos pavilhões que mais tarde dariam origem às galerias de arte veio naturalmente, assim como a constatação de que o complexo deveria ser aberto ao público. “Fui percebendo que tudo que estava sendo formado transcendia a posse individual. Havia um valor como conjunto de acervo botânico e de arte que deveria se tornar um patrimônio acessível a todas as pessoas”, afirma Paz.
Jardim Veredas é um dos jardins temáticos de Inhotim, com abundância de plantas terrestres e aquáticas. As obras de arte intensificam a conexão com a natureza. Foto: Rossana Magri/Divulgação
Jardim Veredas é um dos jardins temáticos de Inhotim, com abundância de plantas terrestres e aquáticas. As obras de arte intensificam a conexão com a natureza. Foto: Rossana Magri/Divulgação
Hoje, 10 anos depois de ter sido aberto ao público, os 140 hectares abraçam diversos jardins com cerca de 5 mil espécies de plantas que refletem uma transição entre o Cerrado e a Mata Atlântica, dando origem ao maior centro de arte ao ar livre da América Latina e um dos mais importantes do mundo. “Inicialmente, os jardins foram pensados como labirintos, concebidos para que o visitante pudesse perder-se entre as galerias e obras de arte, ao ar livre”, explica Marta Mestre, curadora de Inhotim.
O Centro de Educação e Cultura Burle Marx abriga em seu topo a obra “Narcissus Garden Inhotim”, da japonesa Yayoi Kusama. Foto: Marcelo Coelho/Divulgação
O Centro de Educação e Cultura Burle Marx abriga em seu topo a obra “Narcissus Garden Inhotim”, da japonesa Yayoi Kusama. Foto: Marcelo Coelho/Divulgação
O lugar ainda preserva essa característica. “Cada percurso é uma trilha, com temáticas relacionadas à natureza, que possibilitam a apreciação”, afirma. Aliás, tudo é pensado para promover a contemplação: desde a grandiosidade das galerias de arte internas, que fazem as pessoas parar por entre as plantas, até a singela presença de bancos no meio do percurso, para que possam descansar.
Instalação que abriga a obra “True Rouge”, do pernambucano Tunga.
Instalação que abriga a obra “True Rouge”, do pernambucano Tunga.
Pedro Nehring, paisagista do Instituto Inhotim, explica que um dos pontos principais no paisagismo do local é o uso predominante de espécies nativas do Brasil, seguindo uma linha condizente com o clima mineiro. Há algumas espécies exóticas, vindas de países como Colômbia, Bolívia, Costa Rica, Estados Unidos, Austrália e nações da África, mas a maioria é brasileira. “Jardim é sentimento. O interessante é criar o nosso, com a nossa cultura e possibilidades. Pode-se dizer que Inhotim tem um estilo de paisagismo brasileiro”, reflete ele.
Em“Através”, o carioca Cildo Meireles lida com nossa percepção de espaço e do mundo.
Em“Através”, o carioca Cildo Meireles lida com nossa percepção de espaço e do mundo.
Outra preocupação é manter a floração o ano inteiro. “Por exemplo, na primavera/verão, as cássias florescem. No inverno, é a vez das quaresmas, das bauíneas e das rosas”, explica o paisagista. Entre as plantas mais emblemáticas do instituto, duas famílias se destacam: a de palmeiras (Arecaceae), que totalizam cerca de mil espécies e variedades, e a dos imbés, antúrios e copos-de-leite (Araceae), com mais de 400 espécies e formas. Enriquecendo os percursos, que já são repletos de jardins variados, estão alguns jardins temáticos, como os aquáticos.

Natureza e arte

E se falar de Inhotim sem mencionar os jardins é impossível, o mesmo vale para falar do lugar sem mencionar as obras de arte, que ora estão por entre as plantas, ora estão dentro das 23 galerias – 19 permanentes e quatro temporárias. Apesar de completamente forte e indissociável, essa união entre natureza, arte e arquitetura existente ali se dá de uma forma muito leve e natural. “A presença da natureza altera a forma como vemos uma obra de arte, pois ela está em constante mutação”, afirma Marta.

Traços arquitetônicos

Um das galerias permanentes de Inhotim é assinada pela artista plástica Adriana Varejão. “Toda estrutura do pavilhão foi concebida para dialogar com as obras dela”, explica Marta Mestre. Um exemplo desse diálogo entre arquitetura e arte está presente no ambiente que comporta a tela “O Colecionador”. “As linhas da pintura se misturam às linhas do pavilhão, enquanto os azulejos têm relação direta com a geometria do lugar”, aponta Marta.
Fotos: Eduardo Eckenfels/Divulgação
Fotos: Eduardo Eckenfels/Divulgação
A obra “Passarinhos” está no terraço do pavilhão. Foto: William Gomes/Divulgação
A obra “Passarinhos” está no terraço do pavilhão. Foto: William Gomes/Divulgação
Obra “O Colecionador”, de Adriana Varejão. Foto: Eduardo Eckenfels/Divulgação
Obra “O Colecionador”, de Adriana Varejão. Foto: Eduardo Eckenfels/Divulgação
“O Colecionador”, feito em óleo sobre alumínio e poliuretano, é a maior pintura da série Saunas de Adriana Varejão. Nela, as linhas dos azulejos pintados confundem-se com as linhas do próprio pavilhão, como se o labirinto criado por ela realmente existisse.
“O Colecionador”, feito em óleo sobre alumínio e poliuretano, é a maior pintura da série Saunas de Adriana Varejão. Nela, as linhas dos azulejos pintados confundem-se com as linhas do próprio pavilhão, como se o labirinto criado por ela realmente existisse.

Arquitetura fotográfica

A fotógrafa nascida na Suíça e radicada no Brasil Claudia Andujar também assina uma das galerias permanentes de Inhotim. São 1,6 mil m² dedicados ao povo Yanomami e à Amazônia, com mais de 400 fotografias feitas por Claudia entre 1970 e 2010. Esse retrato de um povo indígena, ligado à terra, rendeu o surgimento de um pavilhão com um tom mais orgânico, levantado com tijolos cozidos de forma artesanal, como explica Marta.
Pavilhão em tijolos cozidos artesanalmente. Foto: William Gomes/Divulgação
Pavilhão em tijolos cozidos artesanalmente. Foto: William Gomes/Divulgação
Foto: William Gomes/Divulgação
Foto: William Gomes/Divulgação
A fotógrafa retrata o povo Yanomami. Foto: Divulgação
A fotógrafa retrata o povo Yanomami. Foto: Divulgação
A obra mostra a conexão do povo com a terra. Foto: Divulgação
A obra mostra a conexão do povo com a terra. Foto: Divulgação
* especial para HAUS

LEIA TAMBÉM

Enquete

Você sabe quais são as vantagens de contratar um projeto de arquitetura para sua obra de reforma ou construção?

Newsletter

Receba as melhores notícias sobre arquitetura e design também no seu e-mail. Cadastre-se!