Estilo & Cultura
Museu a céu aberto completa 10 anos aliando arte e paisagismo
A natureza, com lago e palmeiras, faz uma moldura exuberante para a obra “Penetrável Magic Square #5”, de Hélio Oiticica. Foto: Rossana Magri/Divulgação | Rossana Magri
Perder-se em um jardim exuberante, obras de arte que propõem a reflexão e estruturas arquitetônicas de tirar o fôlego. Esse pode ser o cenário ideal para um dia completamente relaxante, que permite a admiração da beleza em suas mais variadas formas. Essa é justamente a atmosfera que o Instituto Inhotim, em Minas Gerais, proporciona a seus visitantes.
Antes de 2006, o jardim botânico e centro de arte contemporânea localizado em Brumadinho, distante 60 quilômetros de Belo Horizonte, e criado pelo empresário mineiro Bernardo Paz, era privado. Tratava-se de uma fazenda de Paz, em que ele começou a dar vazão ao hobby de cultivar plantas e aprender sobre botânica depois de uma viagem a Acapulco, no México, onde viu um evento realizado em um jardim, com a presença de uma orquestra tocando em meio à natureza. A união da música com o entorno natural e as pessoas aproveitando a festa inspiraram o empresário a criar um jardim em sua fazenda.
Um dos amigos pessoais do empresário, o paisagista brasileiro consagrado mundialmente Roberto Burle Marx encantou-se pelo complexo que estava se formando e, durante várias conversas informais, trocou figurinhas com Paz sobre o paisagismo do local. As influências de Burle Marx aparecem em vários momentos, como nos maciços de plantas que inundam de cores e na preferência pelo uso de espécies tropicais.
A construção dos pavilhões que mais tarde dariam origem às galerias de arte veio naturalmente, assim como a constatação de que o complexo deveria ser aberto ao público. “Fui percebendo que tudo que estava sendo formado transcendia a posse individual. Havia um valor como conjunto de acervo botânico e de arte que deveria se tornar um patrimônio acessível a todas as pessoas”, afirma Paz.
Hoje, 10 anos depois de ter sido aberto ao público, os 140 hectares abraçam diversos jardins com cerca de 5 mil espécies de plantas que refletem uma transição entre o Cerrado e a Mata Atlântica, dando origem ao maior centro de arte ao ar livre da América Latina e um dos mais importantes do mundo. “Inicialmente, os jardins foram pensados como labirintos, concebidos para que o visitante pudesse perder-se entre as galerias e obras de arte, ao ar livre”, explica Marta Mestre, curadora de Inhotim.
O lugar ainda preserva essa característica. “Cada percurso é uma trilha, com temáticas relacionadas à natureza, que possibilitam a apreciação”, afirma. Aliás, tudo é pensado para promover a contemplação: desde a grandiosidade das galerias de arte internas, que fazem as pessoas parar por entre as plantas, até a singela presença de bancos no meio do percurso, para que possam descansar.
Pedro Nehring, paisagista do Instituto Inhotim, explica que um dos pontos principais no paisagismo do local é o uso predominante de espécies nativas do Brasil, seguindo uma linha condizente com o clima mineiro. Há algumas espécies exóticas, vindas de países como Colômbia, Bolívia, Costa Rica, Estados Unidos, Austrália e nações da África, mas a maioria é brasileira. “Jardim é sentimento. O interessante é criar o nosso, com a nossa cultura e possibilidades. Pode-se dizer que Inhotim tem um estilo de paisagismo brasileiro”, reflete ele.
Outra preocupação é manter a floração o ano inteiro. “Por exemplo, na primavera/verão, as cássias florescem. No inverno, é a vez das quaresmas, das bauíneas e das rosas”, explica o paisagista. Entre as plantas mais emblemáticas do instituto, duas famílias se destacam: a de palmeiras (Arecaceae), que totalizam cerca de mil espécies e variedades, e a dos imbés, antúrios e copos-de-leite (Araceae), com mais de 400 espécies e formas. Enriquecendo os percursos, que já são repletos de jardins variados, estão alguns jardins temáticos, como os aquáticos.
Natureza e arte
E se falar de Inhotim sem mencionar os jardins é impossível, o mesmo vale para falar do lugar sem mencionar as obras de arte, que ora estão por entre as plantas, ora estão dentro das 23 galerias – 19 permanentes e quatro temporárias. Apesar de completamente forte e indissociável, essa união entre natureza, arte e arquitetura existente ali se dá de uma forma muito leve e natural. “A presença da natureza altera a forma como vemos uma obra de arte, pois ela está em constante mutação”, afirma Marta.
Traços arquitetônicos
Um das galerias permanentes de Inhotim é assinada pela artista plástica Adriana Varejão. “Toda estrutura do pavilhão foi concebida para dialogar com as obras dela”, explica Marta Mestre. Um exemplo desse diálogo entre arquitetura e arte está presente no ambiente que comporta a tela “O Colecionador”. “As linhas da pintura se misturam às linhas do pavilhão, enquanto os azulejos têm relação direta com a geometria do lugar”, aponta Marta.
Arquitetura fotográfica
A fotógrafa nascida na Suíça e radicada no Brasil Claudia Andujar também assina uma das galerias permanentes de Inhotim. São 1,6 mil m² dedicados ao povo Yanomami e à Amazônia, com mais de 400 fotografias feitas por Claudia entre 1970 e 2010. Esse retrato de um povo indígena, ligado à terra, rendeu o surgimento de um pavilhão com um tom mais orgânico, levantado com tijolos cozidos de forma artesanal, como explica Marta.
* especial para HAUS