Estilo & Cultura
A onda nos EUA é construir castelos medievais, entenda por quê
Castelo Highlands está à venda por R$ 42 milhões em Bolton Landing, Nova York. A estrutura é toda de madeira com revestimentos de pedra. Fotos: Nathaniel Brooks/The New York Times | NYT
Roger Declements gosta de construir seus castelos da maneira medieval. Ele começa com pedra – cerca de 900 toneladas – e então faz duas paredes paralelas. Depois de anos de trabalho, algumas vezes até uma década, essas paredes formam a base do que ele considera a residência “mais avançada, forte e confortável” que uma pessoa pode ter.
“Se você quer uma casa segura, construa um castelo”, diz Declements, cuja empresa se chama CastleMagic. E ele construiu cinco até agora, em Washington, Utah e Idaho. Ao contrário dos castelos feitos séculos atrás, os seus têm isolamento, encanamento moderno e outras amenidades para que as pessoas queiram morar neles – e pagar algo em torno de US$1 milhão.
Nos Estados Unidos, onde não há castelos medievais autênticos, os de imitação são poucos e estão distantes entre si. Mas o interesse tem aumentado, em parte por causa da popularidade de livros e séries como “Vikings”, “DowntownAbbey”, “Game of Thrones” e “Harry Potter”.
“Quando as pessoas constroem castelos nos EUA, são estruturas de fantasia”, diz John Sexton, professor associado de Inglês, com foco em literatura medieval, na Universidade Estadual Bridgewater, em Massachusetts. “Castelos de verdade são estruturas de defesa. Eles não eram pensados para serem lugares confortáveis para morar. Você estava dentro deles porque as pessoas lá foram queriam te matar.”
John Lavender II seguiu o caminho do conforto e da fantasia quando construiu um castelo para si. Ele montou uma estrutura simples de madeira e então transportou centenas de toneladas de pedra, colocando cada uma no lugar à mão. Nos últimos 35 anos, criou um imponente reduto de pedra no Lago George, no interior de Nova York. Ele gosta de lembrar principalmente do trabalho com o filho na casa de campo. “Colocamos as pedras em um verão juntos, foi um trabalho muito duro”, conta.
Os aficionados por castelos, principalmente aqueles que sabem alguma coisa sobre os que pontilham os campos europeus, zombam das versões americanizadas das antigas fortalezas da Europa. Eles usam palavras como “Disney” e “confeitaria” para descrevê-los. No entanto, mesmo do outro lado do oceano, tem havido um aparente ressurgimento do interesse em castelos entre aqueles que possuem recursos sobrando.
“Quando começamos a vender castelos quatro anos atrás, iniciamos com 20 ou 30”, conta Michael Braunholtz, diretor de vendas da imobiliária Prestige Property Group, de Londres. “Não podíamos acreditar no número de pessoas que entravam em nossa página da internet. Duas vezes mais do que as casas nobres, Mônaco, Saint-Tropez e Veneza. O número de pessoas procurando castelos foi colossal.”
Ele diz que sua empresa algumas vezes tem 200 pedidos por semana. Enquanto castelos como os de Declements no norte da costa do Pacífico são vendidos pelo valor de um apartamento de um quarto em Manhattan, o trabalho da vida de Lavender, conhecido como Castelo Highlands, está listado para venda pelo preço real de US$12,8 milhões.
Declements diz que vendeu seu último castelo, no Lago Pend Oreille, em Idaho, por cerca de US$ 1 milhão, valor que afirma ser acima do de outras casas na região. Ele conta que está construindo mais dois.
Esse não é a primeira moda de castelos nos Estados Unidos. No começo do século XX, homens como o editor de jornais William Randolph Hearst e o herdeiro da fortuna de uma empresa de vidro Raymond Pitcairn construíram castelos para abrigar sua coleção de arte e tapetes medievais.
“Muitos dos monumentos da Europa estavam em ruínas e foram facilmente exportados, porque não havia impostos”, explica Martha Easton, professora assistente de História da Arte e Museologia na Universidade Seton Hall, em South Orange, Nova Jersey. “Eles queriam colocá-las em castelos medievais e não em casa velhas.”
A pesquisa de Easton foca no castelo Hammond em Gloucester, em Massachusetts, construído por John Hays Hammond Jr. Ele foi o inventor dos torpedos controlados por rádio, mas era fascinado pelo passado, conta ela.
Esses construtores do século XX nem sempre foram fiéis à história. O Castelo Hammond tem uma grande sala que lembra o interior de uma igreja medieval e vitrais nas janelas, mas também possui lareiras imensas, que não tinham a ver com os originais, e um pátio que leva a uma piscina, descreve Easton.
Muitos dos maiores castelos da primeira moda se tornaram museus: o Hearst, ao sul de San Francisco; o Glencairn de Pitcairn, nos arredores da Filadélfia; e o Hammond. O Castelo Gillette, em East Haddam, em Connecticut, foi construído por um ator famoso por interpretar Sherlock Holmes.
Mas existem pequenas relíquias daquele tempo que ainda persistem como moradia. Elas só não são muito propícias para a vida no mundo moderno nem fáceis de reformar.
Maria Barr, corretora de imóveis da Select Sotheby’s International Realty, está tentando vender um castelo de 800 metros quadrados no centro de Albany. Foi construído no final dos anos 1800 e tem heras subindo em sua torre de pedra.
Pelo lado positivo, esse espaço enorme sai por pouco menos de US$ 800 mil – mas há desvantagens. Por exemplo, existe apenas um banheiro completo no castelo de quatro andares. “Não é uma casa para a qual você pode mudar já”, explica Barr. “As cozinhas e banheiros são realmente rudimentares. Quem comprar terá que adicionar mais banheiros.”
Castelos chiques da Europa, com seu esplendor do velho mundo, não são muito mais fáceis de vender. Braunholtz conta que sua empresa comercializou apenas alguns, apesar das centenas de milhares de pessoas que olham as ofertas on-line.
“O tamanho, a escala, o preço e a quantidade de dinheiro que é preciso para a manutenção do castelo assustam uma boa parte do mercado. É menos do que dois por cento das pessoas com dinheiro. E dessas, a maioria prefere um chalé de luxo em uma região de esqui ou uma propriedade com vista para o mar em Saint-Tropez.”
Ele diz que uma das coisas mais difíceis na hora de vendê-los é eliminar as pessoas que não podem pagar. Oferecer um castelo “atrai todas essas fantasias com conotações da Disney e neoarturianas que não queremos. Tenho outras propriedades que podem ser chamadas de castelo, mas não falo que é um castelo porque afasta os compradores reais”, diz Braunholtz.
Ele afirma: “Não estou dizendo que a palavra ‘castelo’ é um cálice envenenado, mas torna tudo mais difícil”. A manutenção de um castelo velho ou novo não é barata. Monique Pignet e seu marido compraram o Castelo de Moh, do século XV no Vale do Loire, na França, oito anos atrás por 1,6 milhões de euros, ou cerca de US$2,1 milhões na época. Tem oito quartos, oito banheiros, adega, várias cozinhas e uma vista linda da região vinícola.
Pignet e o marido gastaram sete anos e o dobro do valor para reformá-lo. “O que queremos agora é ganhar dinheiro alugando-o para pagar a manutenção. É a única maneira de possuir um exemplar hoje, porque você não tem empregados. Quando você mora em um castelo, precisa de muita gente. Não dá para limpar tudo sozinha, é muito grande.”