Estilo & Cultura

A história das “falsas” Ruínas de São Francisco, marco na paisagem de Curitiba

Sharon Abdalla*
24/10/2017 09:30
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Passeio pelo Caminho de São Francisco é um dos destaques do fim de semana. Foto: Letícia Akemi/Gazeta do Povo | Leticia Akemi

Rota dos passeios de domingo e das atividades culturais de muitos curitibanos, as Ruínas de São Francisco têm uma história curiosa. Distantes de serem o que sobrou de um edifício demolido pela ação do homem ou do tempo, suas paredes de pedra são, na verdade, resquícios de uma construção inacabada do que viria a ser a Igreja de São Francisco de Paula, que atravessou as décadas praticamente ilesa ao crescimento da cidade.
Outro diferencial das ruínas é o fato de elas serem tombadas pelo patrimônio histórico do estado. Isso porque, juntamente com o Belvedere, elas compõem o conjunto de edificações da Praça João Cândido, que recebeu o título em 1966.
“Um dos últimos vestígios de nossa arquitetura colonial, não ficou pelo exemplo de técnica construtiva (…). Pela função que teria, se tivesse sido concluída, pouco provável. Consciência patrimonial, por sua vez, é tema recente, comparado ao tempo de sua existência”, escreve Vera Regina Biscaia Vianna Baptista, na obra “Ruínas de São Francisco: dois séculos de história e mito”, ao tentar identificar a justificativa para a manutenção da construção incompleta.

Obra inacabada

Para compreender a história das Ruínas de São Francisco é preciso voltar no tempo. O ano era o de 1798, quando o bispo de São Paulo, Dom Mateus de Abreu Pereira, em passagem por Curitiba, manifestou preocupação com relação à situação das três igrejas então existentes na cidade: a Matriz, de Nossa Senhora da Luz dos Pinhais, a de Nossa Senhora do Terço e a do Rosário, que estavam em mau estado de conservação.
Tal fato chegou aos ouvidos do coronel e comerciante de gado Manoel Gonçalves Guimarães, que hospedou o bispo em fazenda de sua propriedade. Homem de posses, que incluíam uma residência em Curitiba, o coronel levou à frente o projeto de construir na cidade uma nova igreja, no local onde hoje estão as ruínas.
Parte da capela mais antiga e ruinas ao lado, no alto de São Francisco(1912).
Parte da capela mais antiga e ruinas ao lado, no alto de São Francisco(1912).
Em 1809, estava pronta a capela (composta pela capela-mor e sacristia), cuja benção ocorreu dois anos depois. Com a continuidade das obras, a intenção era a de que a capela desse lugar à Igreja de São Francisco de Paula.
Os registros dão conta de que a alguns vigários foi atribuída a tarefa de zelar pela capela, mas nenhum deles conseguiu levar a obra adiante. A prioridade dada ao restauro ou ao término de outras igrejas da cidade era outro empecilho que se colocava à conclusão da igreja dedicada ao santo franciscano. Em 1860, por exemplo, as pedras que dariam fim à construção foram utilizadas na obra da torre da antiga Matriz, hoje Catedral Metropolitana Basílica Menor de Curitiba. Do que viria a ser a Igreja de São Francisco de Paula, então, sobraram a capela-mor, a sacristia e parte das paredes laterais.

Belvedere

No início do século 20, a Mitra Diocesana permutou a área da atual Praça João Cândido com a prefeitura de Curitiba por uma localizada na Rua Saldanha Marinho (onde foi construída a atual Igreja de São Francisco de Paula). O prefeito Cândido de Abreu, então, pôs abaixo a capela, sem dar fim ao restante da construção, para dar lugar à construção do Belvedere, para que a população tivesse um local para apreciar a cidade.
“É curioso imaginar que há cem anos, época em que não se discutia patrimônio e em que a cidade estava se modernizando, curiosamente [o prefeito] tenha deixado aquele testemunho [do que deveria ter sido] a antiga igreja”, pontua Marcelo Sutil, diretor de patrimônio da Fundação Cultural de Curitiba (FCC).

Arquibancada

Passadas mais de seis décadas, e após o tombamento da Praça João Cândido pelo estado, as ruínas foram transformadas em um anfiteatro e receberam a instalação das arquibancadas que conhecemos hoje.
Abrigando cerca de mil pessoas, as Ruínas de São Francisco recebem espetáculos cênicos, como apresentações de circo, música, dança ou outras artes performáticas, como enumera Beto Lanza, diretor de ação cultural da FCC. “Elas [também servem] a um momento de lazer solitário, para se ler um livro ou ouvir música”, acrescenta.
Embaixo da plateia, a Associação Profissional dos Artistas Plásticos do Paraná mantém uma galeria que apresenta um panorama do que é produzido pelos profissionais do estado.
“As Ruínas de São Francisco estão incorporadas à paisagem da Praça João Cândido. Nela temos muitos testemunhos de como se construía e do que havia ali [no passado]”, completa Sutil.
*Colaborou Beatriz Mira.

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