Design à base de fungos

DW! Design Weekend 2023

Paranaenses levam inovação para DW! com primeiro móvel brasileiro em micélio

Cristina Seciuk
21/03/2023 21:52
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Mesa Sertão, do Anima Studio Design para Mush, é primeiro móvel a base de fungos produzido no Brasil.

Três pés e estrutura em metal, tampo redondo produzido em vidro e... cogumelos. Essa é a mesa Sertão, assinada pelo Anima Studio Design e desenvolvida pela startup de biotecnologia Mush (ambas paranaenses). Apresentada durante o BoomSP Design, um dos eventos-âncora da DW! Semana de Design de São Paulo, é o primeiro móvel brasileiro produzido a partir do micélio, a parte vegetativa dos fungos, responsável pelo seu crescimento e sustentação.
Batizada em homenagem à região nordestina castigada pela seca, a peça foi executada tendo o biomaterial como protagonista para alcançar o conceito proposto por Sharon Abdalla, Welison Santos e Leandro Fragoso, trio de designers co-fundadores do Anima - reconhecido na primeira edição do Prêmio Adriana Adam de Design e selecionado para o Salone Satellite de Milão de 2022.
"Nossa ideia é retratar a vida, a pujança que existe na região, comumente lembrada ou referenciada como um lugar de pobreza, escassez (seja de água ou de outros recursos), mas que é muito rica culturalmente, de saberes locais também muito ricos, mesmo com todas as adversidades. Então, a ideia foi partir dessa escassez inicial, que primeiro vem à mente, e fazer a contraposição com a abundância. Para isso o micélio é uma parte fundamental do projeto, foi uma maneira de materializar o conceito", destaca a designer e jornalista Sharon Abdalla, em referência à maneira como a matéria-prima escolhida toma forma.
Os designers Welison Santos e Sharon Adballa, do Anima Studio Design, posam junto da mesa Sertão.
Os designers Welison Santos e Sharon Adballa, do Anima Studio Design, posam junto da mesa Sertão.
O micélio é uma massa formada por fibras e ramificações (muito semelhante a raízes) que, quando encontra condições favoráveis, cresce na matéria orgânica vegetal. São aqueles fiozinhos brancos e finos que podemos ver no solo, abaixo de cogumelos (que apesar de serem estruturas mais vistosas têm função estritamente reprodutiva) ou sob troncos em decomposição. Com a tecnologia da Mush, ele é cultivado em laboratório utilizando resíduos da agroindústria, neste caso serragem proveniente da silvicultura.
Na prática (e em termos leigos), o fungo se alimenta da serragem e cresce de modo controlado, tornando-se uma espécie de cola para um aglomerado orgânico. "Pegamos essa serragem, misturamos a ela água e o nosso fungo [o micélio] e ele cresce formando um bloco único e sólido", resume o diretor de produto da Mush, Leandro Oshiro, ao explicar o processo.
Ao ser confinado, esse aglomerado de fungo com matéria vegetal continuará a crescer até ser limitado pelas paredes do recipiente em que foi colocado, permitindo a criação de peças em formatos pré-moldados, como é o caso do tampo da mesa Sertão. Assim, a proposta une a aridez sertaneja (representada na coloração e no baixo relevo, que lembram a terra rachada) ao toque macio do biomaterial, numa ressignificação da escassez a partir da proliferação abundante, característica do micélio.
Co-fundador do Anima Design Studio, Welison Santos revela que o tempo efetivo de produção foi de uma semana, considerando-se o ciclo do micélio, desde a aplicação do material em moldes, seu crescimento, desmolde e secagem. A última etapa promove a inativação do fungo, tornando-o estável e apropriado para a utilização em móveis e outras peças - que devem chegar. Santos antecipa que a mesa já apresentada é parte de uma coleção. Os demais protótipos estão em desenvolvimento e, segundo ele, devem contar com novos materiais da parceria com a Mush, como o biotecido de fungos.