Design

Jum Nakao fala de essência e sensibilidade

Eloá Cruz
30/11/2015 00:00
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Foto: André Batista/Divulgação | AndreBatista

PERFIL
Neto de japoneses, o paulistano Jum Nakao parece ter uma relação mágica com o design. Ele tem a sensibilidade de emocionar e tirar o fôlego com seus trabalhos. O marcante projeto Costura do Invisível, apresentado na São Paulo Fashion Week de 2004, fez refletir sobre o processo caótico da indústria da moda. A apresentação brasileira durante a cerimônia de encerramento das Olimpíadas de Londres, em 2012, foi  assinada por ele. Para Jum, o design vai além da simples estética. Nenhum desenho e forma são criados ao acaso, passam sempre uma mensagem, um sentimento. A reportagem da Haus conversou com o artista durante o 2º Seminário do Núcleo Paranaense de Decoração, sobre seus trabalhos de mobiliário.
Com trabalho consagrado no mundo da moda, Jum Nakao agora veste também a casa.
 Caixa de Memórias-Balanço foi criada por Nakao para a exposição da Dpot e remete à infância. Foto: Dopt Mube/Divulgação
Caixa de Memórias-Balanço foi criada por Nakao para a exposição da Dpot e remete à infância. Foto: Dopt Mube/Divulgação
Você já se consagradou na moda, principalmente depois do projeto Costura do Invisível. Como foi que surgiu esse interesse pelo design de mobiliário?
Quando desenhamos, não estamos criando nada mais que a percepção do receptor. Nada mais que desenhar a sensibilidade de algo para o usuário final, a pessoa com quem nós estamos dialogando por meio do nosso trabalho, quer seja roupa, obra de arte, ou design. Estamos desenhando matéria humana. O que permanece é um legado que você deixa para o receptor. Resumindo: não vejo nenhuma transição entre a moda e design de mobiliário, vejo uma nuance em estabelecer relações que eu venho criando ao longo dos anos.
O que a experiência da confecção de vestuário proporcionou para seus novos trabalhos?
Eu acho que o principal é a compreensão da ergonomia, de que você veste algo que interage, que é o corpo humano. Ele precisa ser conduzido para outras experiências a partir dessa que eu tive inicialmente na confecção. Quando você atua na indústria da moda, está trabalhando com um suporte que é a segunda pele do corpo humano. E quando você passa a atuar em outras áreas, aquela proximidade, aquele cuidado com o conforto na confecção que torna quase imperceptível ao toque de tão perfeito que é o trabalho, permanece. Isso é algo que acaba sendo parte de outros projetos. De alguma forma, eu procuro sempre incorporar essa suavidade. Qualquer projeto em que eu venha desenvolver tem essa preocupação com a leveza.
Seu trabalho na confecção sempre foi dotado de versatilidade: uma blusa que virava capuz, virava bolsa. Você também procura trazer essa proposta de versatilidade dentro do design de mobiliário?
Acredito que um espaço é dado ao observador para que ele possa interagir, transformar, com a obra. É um vazio que sempre deve existir. Você nunca deve impedir que a pessoa vislumbre um sentido próprio, que cabe somente ao indivíduo atribuir a qualquer obra. Somos todos diferentes. A peça vai impactar cada pessoa de formas diferentes. E se você permitir que haja um espaço a ser preenchido pelo usuário, está praticando a generosidade em fazer com que seu trabalho seja completado por quem você o oferece. Não é um trabalho hermético, tem a sua cara e pronto. É um trabalho para todos. Isso existe na moda e é importante que haja em qualquer obra, quer seja no design, nas artes plásticas, ou com o próprio texto.
Você trabalhou com muitos materiais diferentes, até com o papel. No mobiliário, no design, existe algum material diferente com que você queira trabalhar?
Eu busco não me ater à materialidade, mas, sim, à significância de um trabalho. Procuro encontrar um sentido, um caminho por onde conduzir, e, a partir da definição dessas coordenadas, num desenho inicial desse mapa, é que se começa a ver os meios para percorrer esses caminhos. Ou seja, as palavras são secundárias, as matérias são secundárias. Elas são decorrentes de uma intenção. Quando você escreve, não procura colocar uma palavra nova no texto. Você as articula para que sua sequência seja uma experiência para o leitor. O importante é o que você quer dizer, a essência. A matéria é decorrente de toda uma construção de linguagem. A linguagem em si tem uma alma, uma essência. Não estou preocupado com a matéria, estou preocupado com o que vai ficar. E a matéria não vai ficar.