Guru do design mundial

Design

“Achei que iríamos ver nascer um design capaz de responder às necessidades da pandemia”, diz Rossana Orlandi

Fernanda Massarotto, especial para HAUS, de Milão
15/08/2022 17:59
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Rossana Orlandi é considerada uma das mais importantes galeristas e  influenciadoras do mundo do design. | Gianni Basso

Sincera, objetiva e sucinta. Rossana Orlandi é tudo isso e mais um pouco. A guru do design internacional é uma fortaleza, apesar dos 78 anos. Cabelos brancos e longos, olhar penetrante e óculos com armação redonda e branca, essa senhora, que nasceu em Cassano Magnago, a 40 km de Milão, é considerada uma das mais importantes galeristas e influenciadoras do mundo do design. Poucos sabem, mas Rossana Orlandi deu os primeiros passos no mundo da moda. Foi colega de turma do estilista Franco Moschino no Istituto Marangoni, de Milão, e chegou a colaborar com nomes como Kenzo, Issey Miyake, Donna Karan e Giorgio Armani.
Há 20 anos, transformou uma antiga fábrica de gravatas, na via Bandello, 14, em um verdadeiro reino do design, onde jovens talentos e designers de renome apresentam seus projetos e obras. Nos últimos dois anos, a italiana tem investido no tema da sustentabilidade com o Prêmio Ro Plastic, com o intuito de desafiar os profissionais a trabalharem com o reuso do plástico. Visionária e polivalente, a galerista, caça-talentos e, é claro, fashion designer conversou com HAUS no mês de julho, antes de curtir merecidas férias.
A primeira edição da mostra  Ro Plastic Prize, em 2019.
A primeira edição da mostra  Ro Plastic Prize, em 2019.

Como era a menina Rossana Orlandi? Como foi a infância da senhora? 

Sou a última de quatro filhos, com uma diferença de idade de 7 a 10 anos para meus irmãos. Eu era rebelde e terrível. Na escola, por exemplo, as professoras tinham de me colocar sentada debaixo da lousa para que eu não atrapalhasse a aula (risos). Fui uma criança muito feliz.

A senhora estudou no Instituto Marangoni (Moda e Design), de Milão, e  um de seus colegas de classe era - nada mais nada menos - Franco Moschino. O seu objetivo era se tornar uma estilista. O que a levou a enveredar para o design? 

Trabalhei com moda por mais de 30 anos. Comecei aos 18 anos e tenho certeza de ter vivido momentos maravilhosos neste ambiente. Eram anos de grande criatividade e pude presenciar o ‘nascimento’ de grandes estilistas. Porém, como tudo na vida, os ciclos se concluem e posteriormente achei que era hora de me dedicar a uma outra paixão, o design.

Rossana Orlandi Gallery é mais que uma galeria, mais que um concept-store. Qual o significado deste espaço para a senhora? 

É a casa do design, uma “Home of Design”. Um local onde o design se encontra, onde público e artistas se confrontam, onde se projeta e se dá forma a muitas ideias. A melhor definição seria: um espaço visionário.

Não há Semana de Design de Milão sem Rossana Orlandi Gallery. A sua galeria é uma das paradas obrigatórias. Como é a preparação para a MDW?

Vocês podem não acreditar, mas é uma jornada árdua que dura 11 meses: um trabalho de muita pesquisa e constante contato com designers e artistas de todo o mundo.
A mostra durante a Semana de Design de Milão deste ano.
A mostra durante a Semana de Design de Milão deste ano.

A senhora se incomoda em ser chamada de “guru do design”?  

Absolutamente não. Pelo contrário, eu gosto e me dá muito prazer. Digo sempre que é uma definição que acaba influenciando o meu senso de responsabilidade em cada escolha que faço e nas decisões que tomo para o meu futuro.

Os jovens designers e artistas de todo mundo - muitos já conhecidos - almejam expor em seu espaço. O que devem fazer para conquistar Rossana Orlandi? Há algum país hoje que ‘produza’ grandes designers? 

Tenho uma teoria:  não há um país específico que produza talentos. Pelo contrário, há grandes designers e artistas em todo o mundo. Uma verdadeira globalização. Hoje, temos jovens designers que nos surpreendem com seus projetos, fruto de muita pesquisa e estudo. São profissionais que organizam seus trabalhos pensando de maneira inovadora, seja em relação ao material, seja pela produção e embalagem. E por isso mesmo, é necessário dar voz e oportunidades às novas gerações e investir em suas ideias. Por vezes, a obra desses jovens serve de inspiração para o mundo externo, principalmente no setor industrial.

Quem são seus jovens designers preferidos atualmente? 

Meus designers preferidos são os que eu recebo e exponho nas minhas galerias em Milão e Porto Cervo, na Sardenha, durante o verão europeu.

Nos dois últimos dois anos, durante a Milan Design Week, a senhora abraçou o tema da sustentabilidade com o projeto RoGUILTLESSPLASTIC, que resultou no Ro Plastic Prize. Para quem é o prêmio e como funciona?

O RoGUILTLESSPLASTIC é um projeto internacional, de 2019, realizado em colaboração com a minha filha Nicoletta, e que contempla além de uma mostra durante a Semana de Design, com a presença de designers e artistas sobre o tema re-Waste, um ‘chalenge’, o Ro Plastic Prize. É um concurso/desafio em que todos, profissionais e não profissionais do setor, podem participar, sem limite de idade. O prêmio é composto por categorias, que podem mudar a cada ano, e inclui projetos baseados no tema ‘re-waste’.
Os finalistas são protagonistas de uma exposição durante a Milan Design Week e um júri internacional escolhe os vencedores que recebem até dez mil euros para investir na implementação do projeto apresentado. Eu e Nicoletta quisemos, desta forma, dar uma prova concreta de que o design pode realmente ser capaz de oferecer soluções na busca de um planeta ­sustentável.
O RoGUILTLESSPLASTIC visa atrair artistas, profissionais criativos e designers de todo o mundo. É uma plataforma onde acolhemos ideias. O objetivo é educar o público sobre uma mudança de pensamento necessária sobre o tema da sustentabilidade. É também um evento global e itinerante já que levamos a mostra para várias localidades no mundo, como Doha, Paris, Londres e Hong Kong, onde reunimos todos os projetos que participam dos eventos promovidos pela galeria.

Na sua opinião, o design mudou com a pandemia? 

Não mudou muito: eu honestamente esperava que mudasse muito mais. Achei que iríamos ver nascer um design capaz de responder às necessidades geradas pela pandemia: objetos e móveis multifuncionais, capazes de se transformarem quando necessário.

No dia 20 de junho, a senhora recebeu o Compasso d’oro pela sua carreira, um reconhecimento internacional atribuído pela Associação para o Desenho Industrial - ADI. O que significa esse prêmio para a senhora? 

Em primeiro lugar, gostaria de dizer que eu, sinceramente, não esperava tal prêmio. Fiquei muito emocionada, principalmente pela quantidade de mensagens que recebi de todas as partes do mundo. É um reconhecimento que, se por um lado me lisonjeia, por outro fortalece ainda mais meu senso de responsabilidade para continuar com meu trabalho.

O mundo da moda perdeu uma estilista, com certeza. Se a senhora não tivesse se tornado uma galerista de sucesso e um dos nomes mais influentes no design internacional, qual seria o seu destino profissional? 

Paisagista. Uma profissão onde mais do que nunca o design e a responsabilidade com a preservação do planeta estão intrinsecamente conectados.