“Milão é sempre Milão”. Esta foi a frase que mais ecoou nos gigantescos corredores da 51.ª edição do Salão Internacional do Móvel. Mesmo com o fantasma da crise assombrando o Velho Continente, o maior evento de design de móveis do mundo, realizado entre os dias 17 e 22 de abril, atraiu os olhares dos quatro cantos do planeta e deve ditar as tendências tanto para os mercados que sofrem com a estagnação (leia-se Europa e Estados Unidos) quanto para os que estão emergindo no mundo da decoração. Entre esses olhares, milhares de brasileiros – cerca de 12 mil dos mais de 330 mil visitantes – e, claro, centenas de curitibanos, ávidos pelas novidades e tendências.
Foi justamente atrás destes olhares locais que a Viver Bem Casa & Decoração seguiu para a meca mundial do design para acompanhar o evento – que além da mostra oficial de móveis e objetos e do Salão Satellite, com trabalhos de novos designers, neste ano trouxe as bienais Eurocucina e o Salão de Banho. Tudo com o objetivo de, mais do que ver o que o mundo inteiro viu, mostrar como estas tendências devem cruzar o oceano Atlântico. “Este é o 12.º ano que venho, o Salão faz parte do meu calendário de trabalho”, conta o arquiteto Jayme Bernardo, que faz a devida ressalva antes de começar a listar o que mais chamou sua atenção: mais do que grandes mudanças entre uma edição e outra, é preciso estar atento à consolidação de estilos, pois esperar por grandes evoluções, em tempos de crise, pode resultar numa grande frustração. Parênteses fechados, que se faça justiça. “Milão é onde tudo começa, o italiano tem a preocupação de sofisticar o design e ensina isso para mundo”, afirma Bernardo.
E, para driblar a crise, nada melhor que a criatividade. Mesmo com poucas mudanças, há sempre algo de novo, seja em relação aos materiais, às cores e texturas, ou até mesmo na forma que um objeto tem de contar a sua história. “As empresas estão tentando se reinventar, ir além do produto, passar as sensações do espaço. O mesmo produto, dependendo da situação, pode transmitir diferente emoções, estar em uma decoração romântica, em uma moderna, minimalista. Este conceito, de ter o aproveitamento dos produtos com ambientações diferentes, enriquece as possibilidades”, afirma Eviete Dacól, diretora da Inove, que comercializa móveis de design de renome internacional na capital.
Materiais
Mas não foi apenas a ambientação que chamou a atenção dos paranaenses. Em relação aos materiais, o que mais se viu foi a aproximação com o tema da sustentabilidade. “Vi muito esta preocupação com tudo o que é sustentável . E também a brincadeira com materiais de resina, com o Corian e o Silestone. Isso esteve presente em quase todos os estandes”, afirma Jayme Bernardo. A mesma linha foi percebida pelo arquiteto Léo Pletz. “Viu-se muito em todo o salão o uso de materiais naturais, ou pelo menos com aparência de natural, para remeter ao ecológico. Não faltaram tons amadeirados e isso é algo que, com certeza, deve chegar ao mercado curitibano.”
Outro material que marcou presença foi o mármore – muitas vezes, aliás, combinado com a própria madeira – presente em tampos, na maioria das vezes com acabamento fosco e espessura bem fina. “Isso mostra um certo retorno ao clássico. E o tamponamento fino vem com muita força, em todos os estandes. Ao invés da grossura de 5 a 10 centímetros trabalha-se com espessuras que variam de 9 a 12 milímetros”, afirma a arquiteta e designer de móveis Katalin Stammer, que não deixa de lembrar do acrílico, presente principalmente em cadeiras e que, na maior parte das vezes, aparece trabalhado em recortes a laser, o que permite um aproveitamento máximo do material.
E se boa parte do Brasil acaba ignorando alguns materiais, o clima de Curitiba permite que o nosso mercado receba de braços abertos o feltro, o couro e as peles, lembra Eviete Dacól. “O feltro, por exemplo, dá um bom acabamento mobiliário, mas não é tão aceito em regiões muito quentes”, diz ela, referindo-se principalmente aos estofados.
Uma das maiores mudanças percebidas no salão, aliás, diz respeito às formas dos estofados. Se em 2011 reinaram os modelos de linhas retas, neste ano o design parece voltar-se mais para as formas arredondadas, sem deixar de lado os projetos mais limpos e minimalistas. “O mobiliário em geral vem mais redondo, traz um volume mais orgânico”, avalia Katalin. As linhas curvas também foram o que mais chamaram a atenção do decorador e cenógrafo Lupércio Manoel e Souza e de Léo Pletz. “Há uma volta às formas orgânicas. O mobiliário faz uma releitura dos anos 1960 e 1970, uma tendência que vem forte para Curitiba”, acredita Plétz.
Cores
Outra mudança percebida pelos entrevistados foi em relação aos tons: neste ano, as cores parecem estar de volta aos ambientes, ao contrário da última edição, em que transitaram pelo lado mais neutro da cartela. Não que os cinzas e azuis, tão presentes em 2011, estejam de fora, como aponta Jayme Bernardo, que cita como tendências tons suaves, que vão do hortência ao blue navy (tom de azul). Mas os tons cinzas, como destaca Eviete Dacól, aparecem mais quentes, para compor ambientes mais aconchegantes. E, apesar de o branco ainda ser um grande curinga em várias apostas, ele começa a ter sua hegemonia ameaçada. “O panorama geral mostra que se saiu da cartela do branco. O que se vê muito é uma aposta em cores sólidas, muito roxo, amarelo e azul. Mesmo em combinações mais neutras, os tons são suaves, mas sempre aparecem com cor. Isso torna os projetos menos apáticos, com mais presença”, explica Katalin. Mas, como estamos falando de como tudo isso deve chegar ao mercado local, Plétz faz a ressalva: o curitibano não tende muito a abusar das cores. Por isso pode ser que muitos nem cheguem por aqui.
De lá para cá
Mas quando todas estas tendências devem desembarcar em Curitiba? Segundo Eviete, muito do que se viu em Milão deve estar por aqui nos próximos meses. “Atualmente, o que se vê no salão aparece no mundo inteiro, o acesso é muito fácil”, justifica, lembrando, porém, que a maioria dos produtos tem um foco muito específico, no público A. Mas as tendências e tecnologias acabam sendo assimiladas por todos os consumidores. “A grande sacada é viabilizar processo produtivo local”, aponta.
Muitas das tecnologias mostradas em Milão, aliás, podem ser ser encontradas hoje no mercado nacional, como explica o diretor da Givi Mobili e da Cinetto do Brasil, Gilson Villatore. “Em termos de ferragens, iluminação para móveis e vidros, o Brasil está conectado com o mundo, alinhado em tempo real aos lançamentos. Principalmente as empresas mais conceituadas, que proporcionam aos seus consumidores a mesma tecnologia apresentada na Itália”.
* A jornalista viajou a convite da Givi Mobili e Cinetto do Brasil.