Herança do ecletismo
BRDE Palacete
O que é a “arquitetura dos ervateiros”? Veja assinaturas do período em Curitiba
Retrato histórico do Palacete dos Leões. Foto: Divulgação/ Fundação Cultural de Curitiba
Não fosse pela erva-mate, o chamado “ouro verde” que crescia nessas terras, o Paraná nunca teria sido Paraná. Hoje uma unidade federativa independente, a região só se tornou província e, depois, Estado, alcançando sua autonomia em relação a São Paulo, justamente por conta da importância que adquiriu o cultivo, a comercialização e exportação da Ilex paraguariensis.
Mais do que as agora consolidadas
linhas fronteiriças paranaenses, a importância desta planta para a história do
sul do Brasil está marcada também na arquitetura, por meio dos poucos
exemplares remanescentes da época de ouro da erva-mate, o final do século 19 e
começo do 20.
linhas fronteiriças paranaenses, a importância desta planta para a história do
sul do Brasil está marcada também na arquitetura, por meio dos poucos
exemplares remanescentes da época de ouro da erva-mate, o final do século 19 e
começo do 20.
Alguns dos edifícios residenciais construídos pelos grandes produtores de erva-mate, em pé até hoje, ostentam o que o arquiteto Key Imaguire batizou de “arquitetura dos ervateiros”. São assim chamados pelos pesquisadores do tema porque são construções marcadas por elementos que têm uma espécie de identidade própria, que ajuda a reconstruir uma imagem do que eram o Estado e sua capital à época.
“O Paraná nunca estudou, nunca fez
um trabalho de pesquisa consistente, que eu tenha conhecimento, sobre os
galpões da indústria da erva-mate, que devem ter sido muito mais extensos e
muito mais complexos do que chegamos a conhecer, com ferramentas e equipamentos
há muito superados e que a essa altura já devem ter desaparecido. O que sobrou
foram as casas que os ervateiros fizeram, isso foi o grande testemunho que
ficou do ciclo da erva-mate”, justifica o arquiteto.
um trabalho de pesquisa consistente, que eu tenha conhecimento, sobre os
galpões da indústria da erva-mate, que devem ter sido muito mais extensos e
muito mais complexos do que chegamos a conhecer, com ferramentas e equipamentos
há muito superados e que a essa altura já devem ter desaparecido. O que sobrou
foram as casas que os ervateiros fizeram, isso foi o grande testemunho que
ficou do ciclo da erva-mate”, justifica o arquiteto.
De acordo com ele, construções como o Solar do Barão e o Palacete Leão Jr. – atualmente Espaço Cultural BRDE, ambas da virada do século 19 para o 20, são representativas pela qualidade dos projetos, repletos de referências adquiridas tanto pelos engenheiros e arquitetos envolvidos, quanto pelos próprios moradores - nestes casos, a família Leão e o Barão do Serro Azul, Ildefonso Pereira Correia, respectivamente. “Eram pessoas que já tinham livre instrução, conheciam pelo menos a região importadora da erva-mate, no Rio da Prata, muitos já tinham visitado a Europa, tinham uma noção do que seria uma arquitetura de boa qualidade”.
Tantas influências faziam com que as construções resultassem em grandes mosaicos de elementos advindos das mais diversas assinaturas, consagrando de vez na cidade o período eclético, ainda que esse também adotasse formas variadas de acordo com cada residência. “Na primeira fase, os ervateiros construíram uma arquitetura urbana de tradição mais alemã. O melhor exemplo é o Solar do Rosário, mas há outras no São Francisco. Mais tarde, se transitava para uma arquitetura mais italiana, menos urbana, mais à vontade no terreno”.
Exemplares e características
Mas que elementos, no fim das contas, caracterizam esta arquitetura dos ervateiros de que fala o professor? Dizer que eram casas do período eclético não significa, para Imaguire, que sejam sinônimos. “Não há uma assinatura específica dos ervateiros. Eles viviam num período em que começava a predominar o eclético, com abertura a influências externas, mas a verdadeira marca da identidade destas construções é o alto padrão de qualidade. Eram os barões da erva-mate, que tinham pretensões aristocráticas e precisavam expressar isso nas suas moradias”, reforça Imaguire.
Em uma
pesquisa realizada nos anos 80 em coautoria com as também arquitetas Elizabeth
Amorim de Castro, Marialba Rocha Gaspar Imaguire e Rosina Coeli Alice Parchen,
o grupo buscou analisar algumas das construções do período para tentar
reconhecer alguns marcadores desta época.
pesquisa realizada nos anos 80 em coautoria com as também arquitetas Elizabeth
Amorim de Castro, Marialba Rocha Gaspar Imaguire e Rosina Coeli Alice Parchen,
o grupo buscou analisar algumas das construções do período para tentar
reconhecer alguns marcadores desta época.
Depois de
observar 18 residências, eles cravaram que a mais antiga das construções era a
casa de Ildefonso Pereira Correia, o Barão do Serro Azul, que data de 1885,
embora não excluam completamente a possibilidade de que alguma tenha sido
finalizada antes disso.
observar 18 residências, eles cravaram que a mais antiga das construções era a
casa de Ildefonso Pereira Correia, o Barão do Serro Azul, que data de 1885,
embora não excluam completamente a possibilidade de que alguma tenha sido
finalizada antes disso.
A mais recente seria a casa de Ascânio Miró Filho, finalizada em 1935. Esse intervalo de precisos 50 anos, portanto, é o que concentra o período mais prolífero da arquitetura dos ervateiros, com edificações no Batel, Alto da Glória, Centro, em regiões como a Praça Senador Correia (próximo ao Terminal Guadalupe), a Rua Desembargador Westphalen e a Avenida Marechal Floriano Peixoto.
Os autores dos projetos também ajudavam a compreender o prestígio das obras: Cândido de Abreu e Ernesto Guaita, nomes essenciais para a história de Curitiba e do Paraná, assinaram algumas das obras.
Com um único pavimento habitável, a maior parte das casas dos ervateiros é marcada pela existência de um porão, que eleva a altura da construção em geral. "O sótão é usado para compor a volumetria e destacar o volume das torres, acrescendo imponência à casa. A opção pela cobertura em telhas é unânime, sendo provável que algumas tenham utilizado originalmente telhas escamadas, depois substituídas pelas francesas", revela o relatório da pesquisa divulgada pelos arquitetos, ressaltando duas exceções no que diz respeito à cobertura: a casa de José Lima, que tem cobertura plana, e a Vila Odette, que opta pelas placas de ardósia.
Os
ornamentos trazem o que os arquitetos chamam de um "vocabulário
eclético" que remete a um aspecto palaciano: parte das construções opta
por vãos em arco pleno, pilastras, balaustradas e platibandas, gradis e
guarda-corpos de escadarias em ferro batido.
ornamentos trazem o que os arquitetos chamam de um "vocabulário
eclético" que remete a um aspecto palaciano: parte das construções opta
por vãos em arco pleno, pilastras, balaustradas e platibandas, gradis e
guarda-corpos de escadarias em ferro batido.
Embora
estas características não estejam presentes em todas as unidades que os
arquitetos analisaram na época, em resumo, eles definem a residência modelo dos
ervateiros como aquela "situada no centro do terreno ou no alinhamento, de
um só pavimento, planta retangular coberta por telhado de quatro águas. Estaria
elevada sobre o nível da rua por um porão alto; a circulação acontecendo por um
corredor central, distribuindo a área social para a frente, os aposentos
íntimos para as laterais e os serviços aos fundos".
estas características não estejam presentes em todas as unidades que os
arquitetos analisaram na época, em resumo, eles definem a residência modelo dos
ervateiros como aquela "situada no centro do terreno ou no alinhamento, de
um só pavimento, planta retangular coberta por telhado de quatro águas. Estaria
elevada sobre o nível da rua por um porão alto; a circulação acontecendo por um
corredor central, distribuindo a área social para a frente, os aposentos
íntimos para as laterais e os serviços aos fundos".
Por fim, as casas trazem ainda pelo menos uma escadaria, que em geral ajuda a acentuar a monumentalidade das construções, finalizadas com detalhes de decoração de assinatura essencialmente eclética.