As festas públicas nas cidades brasileiras estão se descaracterizando. Sempre tiveram o caráter de corso (palavra com a mesma raiz de percurso) e agora estão localizadas, fixas num mesmo local ou logradouro.
As próprias casas antigas, quando assobradadas, tinham no pavimento superior sacadas e balcões diante das portas e janelas. Daí, os moradores assistiam à passagem das festas – sendo as mais comuns e prestigiosas as procissões entre a Matriz e alguma das capelas de Irmandade. Não menos importante, para quem tinha um sobrado – bastante raro naqueles tempos –, era ser visto. Para tanto, não era suficiente se colocar a cavaleiro da rua, mas também fazer a decoração do guarda-corpo com toalhas e tapetes. E, é claro, em toaletes e modelitos vistosos para as senhoras e senhoritas. As procissões atuais estão em extinção, e as festas de igreja são localizadas, num adro ou pátio.
Mas as poucas festas laicas também se articulavam num percurso: a chegada de uma autoridade, da entrada da cidade, se deslocando até a Câmara, ou algum palácio residencial.
No século 19, as “sociedades líricas” (toda cidade tinha uma ou duas, rivais entre si) constituíam bandas que se apresentavam no coreto, e aí chegavam já tocando através das ruas.
Atente-se a que os percursos eram sempre nas áreas centrais, onde ficavam matrizes, câmaras e praças com coreto. Vantagem da sociabilidade, portanto, para quem morava nesses locais e suas imediações.
No século 19, as “sociedades líricas” (toda cidade tinha uma ou duas, rivais entre si) constituíam bandas que se apresentavam no coreto, e aí chegavam já tocando através das ruas.
Atente-se a que os percursos eram sempre nas áreas centrais, onde ficavam matrizes, câmaras e praças com coreto. Vantagem da sociabilidade, portanto, para quem morava nesses locais e suas imediações.
Já o carnaval, constando também em deslocamento e não por acaso sendo chamado de “corso”, com desfile de escolas de samba, se articula no deslocamento linear. Aleatório em princípio, sem ponto fixo para partida e chegada, mas priorizando ruas centrais. Um pouco, talvez, seguindo os caminhos do footing, buscando os locais de maior visibilidade. Em tempos do trânsito de carros mandando na cidade, passa a haver um percurso fixado pelas autoridades.
Embora use o mesmo tipo de deslocamento, o desfile militar não é propriamente uma festa e, normalmente, acontece com ponto de partida e chegada bem precisos.
No entanto, todas essas manifestações festivas tendem a diminuir. Inclusive o carnaval, confinado aos sambódromos para fins de arrecadação turística. A festa contemporânea está amarrada aos monstruosos, literalmente, equipamentos sonoros. Diante deles, as pessoas se agitam, pulam e gritam durante horas, o que as torna, parece, muito felizes. Infeliz fica quem tem um desses palcos com imensos auto-falantes montados nas imediações de sua casa – é noite sem dormir com certeza.
Mas, já que o deslocamento linear está deixando de ser importante, porque não fazer as festas públicas nos estádios de futebol? Eles são feitos para conter multidões. Em Verona, uma antiga arena de gladiadores foi transformada em local de prestigiosas apresentações musicais; há notícias de que o Coliseu também o será.