Tudo que é sólido desmancha no ar

Key Imaguire Junior
27/02/2016 01:00
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Foto: Marialba Gaspar Imaguire.

Ao construírem suas “vilas”, os novos burgueses procuram a proximidade – e seu prestígio social permeia ao bairro ou rua escolhida.
Nas cidades coloniais, a preferência era pela Praça da Matriz – nas quais restam, ainda, alguns de seus sobrados senhoriais. Mas o agito desses logradouros centrais não agrada aos novos donos do dinheiro – e os locais escolhidos guardam deles uma prudente distância.
Optam também por um tipo de arquitetura vistosa, ornamentada e imponente – vive-se o período do Ecletismo – buscando referências históricas na aristocracia europeia. São plantas que, ao contrário das coloniais, fogem ao retângulo, recortadas para favorecer volumetrias escultóricas envolvida por jardins. E aí, na soma desses jardins – bem visíveis como convém – é que o bairro burguês configura uma região especial da cidade, aquela bonita que se mostra, orgulhosamente, aos visitantes.
Mas, se a origem da riqueza já é instável – erva-mate, madeira, café – sua organização transita, cada vez mais intensa e rapidamente, das famílias regionais para os grandes grupos internacionais. As prefeituras castigam com impostos extorsivos esses prestigiosos terrenos que, verticalizados e adensados, recolhem somas muito maiores. A manutenção dessas construções – feitas com materiais que vão sendo substituídos no mercado por outros, mais industrializados – se torna dispendiosa, difícil. A mão de obra não dá mais conta dos velhos refinamentos.
O jeito é se conformar com o anonimato de um apartamento ou condomínio e alugar a elegante, espaçosa “Vila”. Inevitavelmente, será transformada numa usina de dinheiro que precise de espaço: clínicas, escritórios de advocacia, cursos de alguma coisa. Empresas que estarão ali para lucrar e não hesitarão em reformar, adaptar, agredir a arquitetura original em favor da produção. O próprio uso de materiais e espaços antigos, mesmo sem modificação, desgasta e arruína construções feitas para fins residenciais. Chega o momento em que algum abominável cálculo custo/benefício irá condenar à morte o valor social e cultural da construção, tornando inviável sua permanência.
É o fim. Se não houver ação restritiva em contrário, todo o trabalho de arquitetura, artes, jardinagem, decoração – subdivididos em infinitos outros itens, cada um dos quais cheio de conteúdo – vai para o chão, em favor de um inexpressivo, quando não ridículo, edifício de luxo.
Algumas contas bancárias engordarão no processo, políticos serão eleitos para favorecê-lo, mas a prefeitura não saciará seu inesgotável apetite por impostos – a destruição continuará. A cidade se esvaziou mais um pouco, deu mais um passo em direção à inexpressividade, mediocridade – globalidade, enfim.