Só a pedra é eterna

Key Imaguire Junior
25/03/2015 18:41
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Dos pastores neolíticos até Stephen Hawking, há um ponto de concordância, que talvez seja uma obviedade: no começo, era o caos. O físico inglês dispõe de dados fornecidos por uma parafernália tecnológica que tangencia o inacreditável – os nossos ancestrais tinham aquilo que nos faz mais falta: tempo para observar e tentar explicar o inexplicável. Caminho mais óbvio – tanto que seguido por todas as civilizações – criar forças superiores às suas, os deuses.
Não é difícil supor que as primeiras construções humanas tenham sido apriscos, feitos com o que havia à mão em abundância, a pedra. Como não será exagero supor que o desgaste e a ruína dos muros que formavam os apriscos tenham sugerido qual a força divina tão invencível: o tempo. Em cada civilização com um nome; entre os gregos, Cronos.
Todas as civilizações mediterrâneas da porta Gibraltar até os confins desérticos do Oriente Médio foram construtoras com pedra – o material mais durável, numa infinidade de tipologias, das mais intratáveis rochas aos mármores de Paros e Carrara.
Os deuses proliferaram ao longo dos milênios – e assim também as construções humanas. E aquelas que, ao longo do nosso percurso, desafiam Cronos, são de pedra. Onde se quer durabilidade, usa-se a pedra.
No século 19, inventa-se a pedra artificial, o concreto, que se torna o material emblemático do modernismo na arquitetura. Sua plasticidade e resistência mudam os rumos da civilização. Não se imagina nossas cidades modernas, sem o concreto.
Mas mesmo seus encomiastas mais exaltados logo se dão conta de que o material é humano e Cronos está de olho: a Villa Savoye, projetada por Le Corbusier em 1928, antes da conclusão em 1931 já incomodava os proprietários com problemas de infiltração. Apenas 12 anos depois, em 1940, já era abandonada. Havia a guerra, todos sabemos, e a Villa penou nas mãos dos dois lados – chegando quase a ser demolida. Foi salva por um movimento internacional de arquitetos – todos modernistas e entusiastas do concreto, já se vê.
Em que pesem as melhorias na tecnologia da concretagem nas décadas mais recentes, não se pode pensar ainda nesse material como desafio ao irascível, feroz e impiedoso Cronos. Construções mais recentes, dos anos 1950 e 1960 – como a Casa Vilanova Artigas, em Curitiba – já apresentam fadiga e requerem cuidados especiais de conservação que fazem sorrir as construções milenares em pedra.
Como se vê, as nossas cidades, como se já tivessem poucos problemas, logo estarão às voltas com mais um: a degeneração do concreto.