Reflexões de Veneza: não se deve culpar a escassez de recursos pela incapacidade de fazer o trabalho

Daniela Busarello
24/09/2016 22:46
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Fotos: James Mollison/Divulgação

Ver-a-cidade

Todo ano acontece uma bienal em Veneza, de Arquitetura ou de Arte. Tenho o privilégio de participar de todas, desde 2007. Estar em Veneza é um sonho. Sua paisagem e situação únicas. A maré e o movimento. A melancolia. E arte e arquitetura em cada passo.
Jovem curador
Em 2016 a Bienal de Arquitetura tem como curador o arquiteto chileno de apenas 49 anos Alejandro Aravena. O mais jovem vencedor do Pritzer Prize (2016). Sua arquitetura é simples, para pessoas desfavorecidas. Faz arquitetura para resolver conflitos políticos, ambientais e econômicos. Faz arquitetura para melhorar a qualidade de vida das pessoas, das cidades, em definitivo. Evita a criatividade superficial e defende a criatividade lógica. Esta bienal é uma batalha aos clichês e aos “arquitetos estrelas”. É uma mostra contra a mediocridade e a banalidade. Contra a MONOTONIA, em favor da urgência, da esperança e da responsabilidade social.
O arquiteto chileno Alejandro Aravena, curador da Bienal de Arquitetura de Veneza 2016. Foto: James Mollison/Divulgação
O arquiteto chileno Alejandro Aravena, curador da Bienal de Arquitetura de Veneza 2016. Foto: James Mollison/Divulgação
Temática
O tema é claro : “Reporting from the Front” ou Relatos da Frente da Batalha. Destaca que não devemos “culpar” a escassez de recursos pela incapacidade de fazer o trabalho. Defende principalmente que contra a escassez a solução é a INVENTIVIDADE. E o símbolo mais visível disso é o próprio cartaz que anuncia o evento, o qual apresenta uma fotografia de uma antropóloga alemã sem os recursos financeiros “ideais” para fazer sua pesquisa nas “linhas de Nazca” no Peru. Não tem possibilidade de contratar um guindaste para observar do alto… use uma escada!
Quatro frentes
A primeira são os projetos que combatem desigualdades, violência, informalidade e poluição; que valorizam a sustentabilidade, a mobilidade, a vida de comunidade, o tratamento de resíduos urbanos; e/ou que resolvem a migração, a segregação das periferias e as soluções pós desastres naturais. Projetos que promovem a QUALIDADE DE VIDA PARA TODOS. A segunda apresenta projetos que o curador admirava e gostaria de saber mais sobre os acertos e resultados.
A terceira são “grandes nomes”, não apenas de arquitetos, mas engenheiros, políticos e dirigentes de ONGs. Por fim, há candidaturas espontâneas. Neste conjunto é importante destacar a participação de 50 novos arquitetos, 33 com menos de 40 anos. Assim a mostra se faz coerente, tem uma massa crítica capaz de responder à estes desafios, com ideias de qualidade.
Espaços
A Bienal de Veneza acontece em dois espaços abertos, quase como dois “parques” : o Giardini, onde estão os pavilhões de cada país, e o Arsenale, onde encontram-se projetos escolhidos pelo curador, que se entrelaçam dentro de salas gigantescas.
Na entrada de cada um destes espaços, Aravena constrói duas “entradas-símbolo” utilizando as 100 toneladas retiradas de desperdícios da bienal anterior. Nada foi comprado, tudo foi reutilizado. “Deve-se separar o valor do custo”.
Orgulho
E “nosso” arquiteto, Paulo Mendes da Rocha, Pritzer em 2006, foi o homenageado com o “Leão de Ouro” pelo conjunto de sua obra de “extraordinária qualidade” e “durabilidade”. Suas obras resistem ao teste do tempo estética e fisicamente. “Com essa consistência, que poder ser o resultado de sua integridade ideológica e da habilidade no campo estrutural, Paulo Mendes da Rocha faz um trabalho não conformista e provocativo ao mesmo tempo”, diz o comunicado do júri.

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