Arquitetura
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Quais são os prédios mais icônicos de Curitiba?
O edifício Acarpa está na lista de edifícios icônicos de Curitiba.
A capital ecológica, alcunha que Curitiba recebe por seus 64,5 metros quadrados de área verde por habitante, chama a atenção também por sua paisagem urbana. Assim como a diversidade de borboletas, pássaros e insetos encontrados nos parques e maciços florestais da cidade, a diversidade está também no tijolo e cimento, nos pilares e arcos, na vanguarda e no contemporâneo.
“A arquitetura em Curitiba nunca seguiu um padrão só”, afirma Guilherme Macedo, sócio do Lona Group e idealizador do projeto Prédios de Curitiba, site que reúne informações e notícias sobre o assunto. “Além de existir uma Curitiba clássica dos casarões e Art Deco, vêm os predinhos na sequência, e aí se começa a ter arquitetura moderna”, observa. Para Fábio Domingos, sócio da Grifo Arquitetura e professor da FAE, Curitiba já teve ares mais cosmopolitas, em que suas edificações conversavam com a arquitetura do mundo. “O Acarpa era vanguarda em sua época. A biblioteca estadual, o Teatro Guaíra, o Barão do Rio Branco. Eles refletiram o que estava acontecendo no mundo”, diz.
A HAUS solicitou a três estudiosos e profissionais de arquitetura que selecionassem quais seriam os prédios icônicos da cidade; aqueles que melhor refletem o que se produz na capital paranaense. O resultado são seis edificações que mostram o fascínio pela verticalidade que houve no início do século 20, a valorização da técnica e do trabalho do arquiteto como um diferencial da construção, e a relação que a cidade desenvolveu com esses prédios ao longo das décadas.
“Arquitetura é contexto cultural, técnico, social. É o contexto do gosto de uma determinada época e do grau de desenvolvimento de uma sociedade. A arquitetura quando é boa, está bem contextualizada, é uma representação do que aquela sociedade pode produzir de melhor”, define Marcos Bertoldi, arquiteto do escritório que leva seu nome. “Nossa topografia é um planalto, então a arquitetura assume o protagonismo de ser os elementos organizadores dessa paisagem cultural, construída”, analisa Bertoldi.
Edifício Marumby
- Ano: 1947
- Endereço: Praça Santos Andrade, cruzamento das ruas XV de Novembro com Conselheiro Laurindo
- Arquiteto: Romeu Paulo da Costa
Construído em uma esquina, o prédio de 12 andares é o início do "fascínio pela verticalização", segundo o arquiteto Fábio Domingos. Sua altura marcou a paisagem horizontal de uma Curitiba da década de 1940, e o Edifício Marumby passou a ser retratado em cartões postais, tomando a mesma importância na representação da cidade que a edificação vizinha, a Universidade do Paraná.
O estilo arquitetônico do Marumby muitas vezes é categorizado como pré-moderno e Art Deco. "Ele dialoga com o mundo, mas não está na vanguarda", explica Domingos. À época, a legislação da cidade exigia que prédios de esquina tivessem um chanfro ou uma curva acompanhando a rua, e no Marumby, o arquiteto Romeu Paulo da Costa optou pela segunda opção. "O Palácio Avenida é dessa época, o Edifício Garcez também. A cidade começou a se verticalizar realmente no final dos anos 1940", descreve Domingos. Como uma espécie de celebração do progresso e da conquista da altura, vencida pelo ser humano, em 1952, uma corda foi esticada entre o Marumby e o Edifício Copacabana, na Rua Amintas de Barros, pela qual caminhou um equilibrista. A foto está exibida no hall de entrada do edifício.
Edifício Anita
- Ano: 1950
- Endereço: Rua Cândido Lopes, 304, Centro
- Arquiteto: Frederico de Oliveira
Antes de ser a referência que é hoje, o Anita não era um edifício memorável por sua arquitetura. Tida como "mais uma entre as outras", a edificação tem inspiração na Art Deco, e seu principal diferencial sempre esteve na localização: uma trifurcação de ruas no centro de Curitiba, próximo aos escritórios, comércios e demais atividades econômicas da cidade. "Essa região era para ser uma Times Square curitibana", comenta Guilherme Macedo, cujo escritório, Lona Arquitetos, fica no primeiro andar do edifício.
Construído pelo jornalista Frederico Faria de Oliveira na década de 1940, o edifício foi batizado em homenagem à sua esposa, Anita Cechelero de Oliveira. As décadas seguintes à de 1950, no entanto, foram somando características e tornando-o um ponto de referência. Começando pela sua composição: com lojas no térreo e dois apartamentos (um por andar), originalmente o prédio não tinha a pitoresca casinha em seu terraço. "Essa casinha foi construída na década de 1990, e na época foi mal vista, porque era uma casa no campo no centro urbano da cidade. As pessoas estranhavam", contextualiza Macedo. Cerca de uma década depois, um dos inquilinos plantou uma hera, que se alastrou pela fachada do edifício.
"O Edifício Anita promove um respiro para quem olha e foi o tempo que trouxe esse diferencial sobre ele. As mudanças foram adicionando identidade", resume Macedo. "Com o comércio mais solto no térreo, com bar e cafeteria, virou um lugar de comércio vibrante e boêmio. O Anita é um desses pontos de acupuntura urbana, que transformou seu entorno", analisa Domingos, citando uma expressão consagrada pelo arquiteto e urbanista curitibano Jaime Lerner.
Edifício Barão do Rio Branco
- Ano: 1958
- Endereço: Rua Barão do Rio Branco, 63, Centro
- Arquitetos: Rubens Meister e Salvador Candia
Quando estava para ser lançado, o Edifício Barão do Rio Branco foi anunciado com distinção: "Nas propagandas, colocavam ele lado a lado com os grandes edifícios de Nova York e São Paulo", diz Fábio Domingos. Seu conceito inicial era um edifício misto de residencial e comercial, em que as unidades mínimas eram estúdios que poderiam ser comprados contiguamente e virar uma unidade maior.
"Naquela época, um dos parâmetros de qualidade era quem havia projetado o prédio, e usavam isto na promoção: ‘de Rubens Meister, o autor do teatro Guaíra, e Salvador Candia, premiado em São Paulo’ '', completa Domingos. O imóvel, com 20 andares, é um exemplo da arquitetura modernista em que a forma é resultado da função do elemento: seus 20 pavimentos têm esquadrias iguais, industrializadas, e suas fachadas foram projetadas para que todas as unidades recebessem insolação controlada. Do lado oeste, havia um brise, que evitava o uso de cortinas, e fazia com que a luz incidisse indiretamente. Estes cobogó e brises que o sombreavam foram retirados, e o revestimento da fachada, alterado, descaracterizando o edifício.
Assim como o Marumby, finalizado quase dez anos antes, a fachada do Barão do Rio Branco deveria obedecer à legislação do formato da fachada na esquina. "Ficaria mais caro desviar um pilar que vem lá de cima para fazer um chanfro ou uma curva, que é uma discussão urbana vinculada à arquitetura eclética, do final do século 19. Rubens questiona isso, porque ele é moderno", conta Domingos. Resultado: os pilares do Barão do Rio Branco seguem retos e contínuos até o chão. A legislação foi revista alguns anos depois.
Edifício Springfield
- Ano: 1975
- Endereço: Alameda Dom Pedro II, 835, Batel
- Arquitetos: Orlando Busarello, Dilva Slomp Busarello e Luiz Forte Netto
"Nada ali é copiado de outros países ou feito para impressionar", sintetiza o arquiteto Marcos Bertoldi. O condomínio Springfield foi construído na década de 1970 e reúne uma série de elementos que o faz ser uma referência arquitetônica até hoje: escala humana, comunicação com o entorno e inventividade técnica pelo conhecimento dos arquitetos.
Sem uma fachada dominante, o edifício retangular traz volume e movimento ao prédio pela alocação das varandas intercaladas. "De qualquer ponto que você olhar, sempre verá o mesmo prédio", observa Bertoldi. Do primeiro ao último andar, a edificação segue igual, sem um pé direito grandioso no térreo, nem extravagâncias no coroamento. A edificação mantém a forma retangular do chão ao topo, não havendo diferença de material ou fachada subalterna em áreas como as de serviço ou banheiros, nem mudança de revestimento.
Seu primeiro pavimento também é um exemplo prático de continuidade: a construção se integra aos jardins e seu entorno, a cidade. "Este projeto tem um pensamento completo da arquitetura, porque leva em conta o terreno, o local de implantação, função, forma. É apoiado em pouquíssimos pilares internos, o que permite total flexibilidade dos espaços", enumera Bertoldi.
Acarpa – atual sede do Instituto de Defesa Rural do Paraná
- Ano: 1977-1979
- Endereço: Rua da Bandeira, 500, Cabral.
- Arquitetos: Luiz Forte Netto, Orlando Busarello e Dilva Slomp Busarello
"O projeto da Acarpa é realmente revolucionário", afirma o arquiteto Marcos Bertoldi, sobre o prédio nunca finalizado, em que funciona hoje a sede da Emater. Edificado como um triângulo retângulo sobre o campo, o prédio tem duas fachadas: a inclinada, com vista para o bairro, e a reta, para a via rápida.
O prédio que hoje abriga a sede do Instituto de Defesa Rural do Paraná (IDR-PR) ficou conhecido pela sigla da primeira instituição que o ocupou: a Associação de Crédito e Assistência Rural. Antes do IDR-PR, foi sede da Emater. Na fachada angulada é que está a parte inacabada. Em seu projeto, as floreiras teriam uma vegetação que faria com que o prédio parecesse estar emergindo (ou submergindo) da terra, além de servirem para regular a temperatura interna sombreando o foyer.
"O projeto traz a paisagem para dentro do prédio. Seria totalmente integrado com o conceito do que hoje consideramos moderno, mas o Acarpa é uma transição do final do modernismo, tanto pela data quanto pelas soluções", classifica Bertoldi. Ele se refere aos arcos que compõem a fachada e que são usados de maneira independente de sua função, como um aceno contemporâneo ao repertório colonial brasileiro. "É uma estrutura de tempos heroicos. Quem hoje construiria um prédio nesse grau estrutural e construtivo técnico?", questiona.
Ícaro Jardins do Graciosa
- Ano: 2019
- Endereço: Rua Ver. García Rodrigues Velho, 70, Cabral.
- Arquiteto: Studio Arthur Casas
O "caçula" da lista foi concluído 40 anos depois do Acarpa e 72 anos depois do Marumby. De certa maneira, o Ícaro Jardins da Graciosa inaugura seu próprio momento na arquitetura da cidade. "O Ícaro mostra que é possível que Curitiba, uma cidade que já foi contemporânea, possa voltar a ser", anuncia Fábio Domingos.
Em 2021, o projeto venceu a categoria Residencial do iF Design Award, um dos mais importantes prêmios do setor no mundo. Ao todo, 10 mil projetos foram inscritos na premiação, e 42 deles tiveram o mesmo reconhecimento na categoria residencial. Ícaro foi o único brasileiro. "É uma arquitetura de vanguarda, que tem relação com o que está sendo produzido em todo o mundo. Se eu deslocar o Ícaro da cidade, em qualquer lugar do mundo vão entender sua arquitetura", elogia Domingos.
Em um olhar mais próximo, o prédio reúne boas lições da arquitetura brasileira das décadas de 1960 e 1970, como o concreto aparente, a estrutura pura, os pilares, áreas avarandadas com vegetação e grandes aberturas para a paisagem urbana. "Cria-se um ambiente de transição entre a área interna e externa, e traz de volta a arquitetura brasileira que era vista com admiração pelo mundo todo", finaliza Domingos.