Turismo arquitetônico
Arquitetura
Rota do Enxaimel (SC) reúne o maior número de casas construídas com a técnica alemã fora da Europa

Casas com treliças em madeira que sustentam paredes de tijolos aparentes. Quem visita Pomerode, em Santa Catarina, pode experienciar a autêntica e tradicional arquitetura germânica ao longo de um trajeto de 16 km. É a Rota do Enxaimel, itinerário turístico que reúne o maior número de casas construídas com a técnica milenar fora da Europa. Ao todo, são 50 casas em diferentes níveis de preservação, todas tombadas a nível estadual, federal ou municipal.
Utilizada na região até a década de 1930, a técnica construtiva enxaimel usa vigas de madeiras encaixadas e pinos também em madeira para criar a sustentação da casa. Depois, uma massa feita de areia, barro, cal, água e mais três fibras, que na antiga Pomerode geralmente era esterco, crina e rabo de cavalo, assentam os tijolos. O fundamento é feito em pedra bruta, e as casas contam com pé-direito alto e aberturas que permitem a passagem de ar, mantendo-as sempre frescas.

Na estrutura, números romanos indicam a sequência da montagem do esqueleto. Tudo pensado para uma necessidade da época: a mobilidade. “A casa é desmontável. Caso meu avô não gostasse daqui, se ele achasse uma colônia melhor, ele desmontava e levava a casa junto”, exemplifica Rogério Siewert, presidente da Associação Rota Enxaimel, que preserva a casa da família construída com a técnica milenar em 1913. “Essa casa foi construída sem pregos, sem ferro, sem cimento, sem energia elétrica, sem combustível e sem dinheiro”, aponta.
Modernização
Para desmontar a casa, os primeiros tijolos da linha são destruídos, para que os próximos sejam retirados à mão, um por um. “Se quiséssemos nos mudar, teríamos que levar a telha, o tijolo e a madeira, fazer nova massa e os pinos”. A casa de Rogério, construída em 1913, foi desmontada em 2015 para a retirada das vigas deterioradas pelo tempo. A reconstrução da casa, que em outras épocas demoraria um ano, demorou apenas três meses. “Cada tijolo que está aqui foi colocado no mesmo lugar”, afirma Rogério.

Antes, a principal madeira utilizada em todas as casas, tanto para a estrutura quanto para o assoalho, era a canela-preta, madeira nativa da Mata Atlântica e que hoje está em extinção. No teto, a madeira era pintada de branco para amplificar a luminosidade em uma época em que não havia energia elétrica. Hoje, as casas que necessitam de restauro trocam a canela-preta pelo araribá, jacarandá e peroba.

Durante o trajeto, é possível notar que algumas casas enxaimel têm a fachada tradicional ocultada por reboco. Rogério explica que a prática começou entre os anos 1940 e 1950, quando a técnica tradicional deixou de ser utilizada. Assim, inspirada pelas novas construções, alguns moradores resolveram modernizar a fachada ocultando os traços enxaimel. Mas isso ocorre apenas na frente da casa — basta dar a volta para notar, novamente, os blocos de tijolo e as treliças em madeira.

Preservação do enxaimel
Como as casas da Rota do Enxaimel foram tombadas, os proprietários podem restaurá-las, desde que preservem suas principais características. É o caso da Casa da Truta, restaurante situado em uma casa enxaimel datada de 1927 que foi remontada em 2017, e o Rancho Lemke, uma das mais antigas do bairro Testo Alto. Construída em 1875, a casa nunca foi reformada, mas passou por uma pintura recente. Ali, mora a quinta geração da família Lemke, enquanto o rancho ao lado tornou-se um restaurante que serve gastronomia típica alemã.

Em frente às casas enxaimel à beira da estrada, um trecho de pavimentação de paralelepípedos quebra a continuidade do asfalto. Isso porque o Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) tem como regra que, em frente às casas, é necessário pavimentar com materiais que permitam a permeabilidade do terreno, o que não é o caso do asfalto.

Outra construção de destaque é a Casa Radünz, construída em 1932. Diferentemente das demais casas da rota, que ainda abrigam moradores ou estabelecimentos comerciais, a Casa Radünz tornou-se um museu. É aberta à visitação e preserva em seu interior tanto os móveis quanto a planta típica: sala e quarto na parte da frente da casa, cozinha na parte de trás. No quintal, é possível conferir uma casinha que serve como defumador de carnes, utilizado até hoje pela proprietária Iracema Radünz.

Rota do Enxaimel
A Rota do Enxaimel foi criada em 2000 com o objetivo de fomentar o turismo na região, abrangendo restaurantes, hotéis, casas de visitação, campings, trilhas e outros comércios. Mas até 2019, a média anual de turistas girava em torno de 10 mil. Para dar "novo gás" ao projeto, sete moradores se organizaram e criaram, em 2021, a Associação Rota do Enxaimel.
Há um ano, a associação firmou uma parceria com a Viacredi e o Sebrae-SC, que proporcionaram treinamento e qualificação aos microempresários da região. Como resultado, o fluxo de turistas aumentou 10 vezes em Pomerode, atingindo a marca dos 100 mil visitantes. Hoje, a Associação Rota do Enxaimel conta com 26 associados, e reforça seu compromisso com a preservação da história da técnica enxaimel.
*A repórter viajou a convite da Viacredi.