Arquitetura

Restauro do Museu Nacional vai custar R$ 15 milhões

HAUS*
03/09/2018 22:33
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O que sobrou do prédio do Museu Nacional após o incêndio. Foto: Mauro Pimentel/AFP | AFP

Desde a noite deste domingo (2), o Brasil acompanha perplexo a tragédia ocorrida no Museu Nacional, que foi consumido pelas chamas que puseram fim à vida da instituição de 200 anos e exemplar icônico do patrimônio nacional. Isso porque, além das cerca de 20 milhões de peças que compunham o acervo, o incêndio destruiu quase que por completo o Paço de São Cristóvão, edifício que serviu de residência da família Imperial e que é tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) desde 1938.
A vice-diretora do Museu Nacional, Cristiana Serejo, disse que a reconstrução do prédio custaria R$ 15 milhões. A estimativa de valor refere-se somente à parte estrutural, uma vez que não há meios de se repor as cerca de 20 milhões de peças do acervo. Logo em seguida o ministro da Educação, Rossieli Soares da Silva, garantiu que o governo federal vai destinar R$ 10 milhões para reformas emergenciais do museu, e afirmou que, posteriormente, outros R$ 5 milhões serão disponibilizados para reconstrução, que pode levar até 4 anos.
Foto: Tânia Rego/Agência Brasil
Foto: Tânia Rego/Agência Brasil
O edifício que abrigava o Museu Nacional dispunha de uma área útil de 13,6 mil m², somados seus três pavimentos, e um total de 122 salas. Cerca de 80% de sua estrutura foi destruída pelo fogo, como avaliou à reportagem o engenheiro Luís André Moreira Alves, coordenador técnico da Defesa Civil do município do Rio de Janeiro, que vistoriou o imóvel na manhã desta segunda-feira (3).
Após a vistoria, a Defesa Civil decidiu pela interdição de toda a área do museu devido ao risco iminente de desabamento de algumas estruturas, em especial as internas, como paredes, divisórias e remanescentes de pisos, como destacou Alves. “Não verificamos risco iminente de colapso das fachadas, mas vamos manter a contenção na área externa em função do risco de rebaixamento do gesso e da queda de partes do reboco e dos adornos“, acrescenta.
Foto: Mauro Pimentel/AFP
Foto: Mauro Pimentel/AFP
Ainda segundo o coordenador, a área irá permanecer interditada até que a administração do Museu Nacional e/ou o poder público contratem uma empresa de engenharia que possa fazer o escoramento das estruturas e a retirada do entulho, que deverá ser “peneirado” para que se possa avaliar se existem bens, documentos ou outros artigos do museu que ainda estejam íntegros ou possam vir a ser restaurados ou recuperados.
“A importância arquitetônica e histórica do edifício que até ontem abrigava os acervos do Museu Nacional transcende classificações tipológicas e de estilo. Trata-se do antigo Paço de São Cristóvão, a primeira residência oficial de chefe de estado no nosso país. Mais que ‘um exemplar’, o edifício é um testemunho único e irrepetível da construção do Estado Brasileiro. E conserva ainda agora as marcas de nossa história e da inserção da auto-imagem do Brasil no sistema civilizatório universal”, destaca Gustavo Rocha Peixoto, professor titular da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Foto: Tomaz Silva Agência Brasil
Foto: Tomaz Silva Agência Brasil
“Penso que ainda é cedo para falar nas possibilidades de restauro do edifício. A consolidação e proteção das paredes exteriores são completamente viáveis e mesmo indispensáveis à memória nacional. [Uma possível] restauração pode restituir a importância simbólica do edifício e até mesmo aumentá-la dependendo do projeto e de sua execução”, avalia Peixoto.

História do Museu Nacional

Erguido no início do século 19, o casarão foi construído pelo comerciante luso-libanês Elie Antun Lubbus (Elias Antônio Lopes, nome aportuguesado), traficante de escravos, em “estilo oriental”, que consistia em uma planta em formato quadrado com um pátio interno e varandas, como explica a pesquisadora Regina Maria Macedo Costa Dantas, na dissertação “A Casa do Imperador: do Paço de São Cristóvão ao Museu Nacional”. Com a vinda da família real portuguesa para o Brasil, Elias realizou uma grande reforma no imóvel e o presentou, em 1º de janeiro de 1809, a D. João, que fez dela sua moradia.
Um ano mais tarde, o imóvel passou por novas obras visando a ampliação de suas instalações. Assim, passou a contar com mais um andar, que deu a ela o ar imponente que se esperava da família real e condições de abrigar o crescimento dela, que teve início com o casamento de dona Maria Tereza de Bragança, filha mais velha de D. João, com D. Pedro Carlos de Bourbon e Bragança, infante da Espanha.
Foto: Alexandre Macieira/Riotur
Foto: Alexandre Macieira/Riotur
As obras foram tocadas por Manoel da Costa, que mais tarde estaria à frente de outras ampliações do Paço,e tiveram como modelo o Palácio Real da Ajuda, atual Palácio Nacional da Ajuda, de Portugal.
Em 1816, foi a vez do arquiteto John Johnson tocar uma nova fase de expansão da residência, por ocasião do casamento de d. Pedro I com a imperatriz Leopoldina. Para ela, o inglês projetou quatro pavilhões, mas executou apenas um, o torreão norte (em dois andares). Entre o final dos anos 20 e início dos anos 30 do século 19, foi erguido o segundo torreão (ao sul), executado pelo francês Pierre Joseph Pézerat em estilo neoclássico, que passou a predominar no palácio.
“O conjunto dos edifícios que formam o Museu Nacional é um exemplar típico da arquitetura neoclássica, que caracteriza o período do Império do Brasil, com composições simétricas, pátios e distribuição dos espaços ao longo deles, jardins internos, ornamentação mais austera e interiores mais sofisticados”, explica o arquiteto e urbanista Washington Fajardo, que, além de atuar no setor privado, é pesquisador visitante na área de arquitetura na Universidade de Harvard.” Antes da chegada da família real, essa forma arquitetônica estava restrita a obras de infraestrutura, como os Arcos da Lapa, por exemplo.”
Museu Nacional, no Rio de Janeiro, sofreu um incêndio de grandes proporções que destruiu boa parte do acervo. Foto: Alexandre Macieira/Riotur
Museu Nacional, no Rio de Janeiro, sofreu um incêndio de grandes proporções que destruiu boa parte do acervo. Foto: Alexandre Macieira/Riotur
A partir de 1850, o Paço de São Cristovão continuou a ter sua estrutura ampliada, reforçando sua importância como “lugar que emana o poder imperial durante o segundo reinado”, como descreve Regina.
A moradia do imperador, então, passou a ser divida em três pavimentos, sendo o primeiro destinado aos serviços gerais e recepções; o segundo, mais ornamentado, com função receber os visitantes; e o terceiro, onde estavam localizados os dormitórios e demais áreas da família.
*Luan Galani, Sharon Abdalla e Estadão Conteúdo.

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