Arquitetura
Reforma sem segredos: um guia para você encarar uma mudança geral em casa
Fotos: Leticia Akemi/Gazeta do Povo | Gazeta do Povo
*Originalmente publicado em 21 de fevereiro de 2018.
Assim como a moda, o setor da construção se renova com frequência e apresenta tendências em revestimentos, acabamentos e formas de morar que são um convite para repaginar a casa e torná-la mais bonita e confortável. Para desfrutar de tudo isso, no entanto, é preciso enfrentar a velha e temida reforma, sinônimo de dor de cabeça para quem já conviveu com semanas de bagunça e sujeira em casa ou com um rombo no orçamento decorrente de despesas adicionais.
E não são poucos os que enfrentam essa “batalha”. Só em Curitiba, 88 alvarás de reforma foram emitidos pela Secretaria do Urbanismo no primeiro semestre de 2017. Este número, porém, tende a ser muito maior se consideradas as obras executadas irregularmente, ou seja, sem terem seus projetos aprovados junto à prefeitura.
Por que reformar?
Os motivos que levam os proprietários dos imóveis a investirem tempo e dinheiro nas obras são diversos, indo desde a solução de problemas estruturais, como infiltração nas paredes ou infestação por pragas no madeiramento do telhado, até a ampliação do imóvel para poder dar conta do crescimento da família. Mas é o desejo de se modernizar e dar um ar contemporâneo aos ambientes o principal motivador das obras em espaços residenciais.
“Fazemos muitas reformas de renovação e troca de layout dos apartamentos. [Isso engloba] melhorar o aproveitamento do espaço por meio do reposicionamento do mobiliário, o que também pode ser considerado uma reforma, pois mexe com piso, gesso, iluminação e instalações elétricas”, contam as arquitetas Luciana Olesko e Maria Fernanda Lorusso, do Olesko & Lorusso Arquitetura e Interiores.
Um exemplo que ilustra o apontamento feito pelas arquitetas é o da reforma de um apartamento construído nos anos 1990, no Batel. As viagens frequentes ao exterior e as referências das mais variadas escolas de design fizeram com que a família, formada pelo casal e suas duas filhas, não encontrasse mais sua identidade no layout do imóvel, o que motivou a mudança do revestimento, dos móveis e da própria configuração do apê.
“As soluções espaciais eram precárias: banheira integrada ao quarto, paredes em ângulos, esquadrias internas com detalhes neoclássicos, azulejos decorados, piso acarpetado e sala de jantar para um máximo de quatro cadeiras. Tudo precisava de urgente atualização”, enumera o arquiteto Marcos Bertoldi, responsável pelo projeto.
Com a reforma, o apartamento ganhou piso, paredes divisórias e armários embutidos em madeira, que trouxeram limpeza visual e uma estética contemporânea aos ambientes. A massa de cimento na coloração natural nas paredes deu o toque contemporâneo ao projeto.
A troca do piso e do revestimento das paredes do banheiro e da cozinha, a extensão da sala de estar até a área da varanda e a integração de ambientes, em especial da cozinha com as salas de jantar e estar por meio da derrubada das paredes, também integram a lista das obras mais solicitadas nos escritórios de arquitetura. “Com estas obras criam-se as chamadas áreas gourmets, onde é possível cozinhar e recepcionar as visitas de forma casual”, lembra a arquiteta Andréa Barbon, sócia-proprietária do Arq Reforma.
Reforma é motivo de estresse
Chegar ao resultado vislumbrado no início da obra demanda disposição e paciência por parte das pessoas que moram na residência. Afinal, além da gestão dos profissionais e dos materiais necessários à execução da reforma, os moradores terão que conviver com dias, semanas e até meses de bagunça, sujeira e alteração na rotina, o que pode abalar a estrutura emocional dos indivíduos e as relações familiares.
“Qualquer obra tem um efeito sobre as relações [familiares] porque ela vai levar a um aumento no nível de estresse. [Isso acontece porque] a pessoa está saindo de uma situação conhecida para entrar em outra de caos dentro daquele ambiente considerado protegido, que é a casa dela, onde estão as coisas dela”, explica Ulisses Domingos Natal, professor do curso de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR).
Ele acrescenta que, por mais que a família tenha se organizado ou se planejado para a obra este efeito irá aparecer e que, quanto mais a obra se estender, maior ele deverá ser. O que varia é o nível de resiliência de cada integrante da família, ou seja, o nível de dificuldade ou de facilidade que cada um tem para lidar com os aspectos da obra. “Outra questão é a relação que as pessoas mantêm entre si, pois, se houver alguma [questão], ela pode acabar se intensificando ou aflorando em decorrência do estresse da obra”, acrescenta Natal.
Em casos extremos, isso pode levar a rompimentos nas relações familiares e até a separação dos casais ao final da reforma, o que não é algo incomum, como lembra o psicólogo Akim Rohula Neto. “A obra traz tantas questões que no meio dela a própria relação começa a passar por uma reforma.
As pessoas começam a avaliar se suas opiniões são levadas em consideração [nas escolhas referentes à obra], se suas necessidades foram atendidas durante e depois da reforma, por exemplo, e, a partir disso, até que ponto vale a pena [permanecer] na relação”, acrescenta.
Os profissionais reforçam que todas essas questões costumam aparecer em decorrência da reforma, mas não são causadas por ela. Eles lembram, também, que quando o casal ou a família estão bem estruturados eles resolvem os problemas e passam pela obra sem maiores traumas.
Outros sentimentos comuns a quem convive com a reforma são a frustração com algum imprevisto ou a irritação com a sujeira e o fluxo de pessoas estranhas no imóvel, além da ansiedade em vê-la concluída.
Obra sem dor de cabeça é possível
Resistir à reforma e desfrutar dos benefícios estéticos e de conforto que ela traz para o imóvel não é tarefa impossível, mas exige atenção a detalhes que fazem toda a diferença no dia a dia da obra.
O primeiro deles refere-se à definição do que será modificado com a reforma e ao estabelecimento de uma comunicação eficaz entre o casal e as demais pessoas que moram no imóvel sobre as questões que a envolvem. “É preciso estabelecer o que cada um quer, qual será a prioridade naquele momento, se é reformar o quarto ou a cozinha, antes de ir à reunião com o arquiteto. Às vezes acontece de casais ficarem brigando na frente dos profissionais [por não terem definido estas questões antes de iniciarem os trâmites para a obra]”, conta Andréa.
Também é preciso olhar com atenção para o ambiente que se pretende reformar para identificar quais atividades são realizadas neste local e para onde elas serão transferidas durante a obra, como lembra o psicólogo Rohula Neto.
Nos casos em que isso dependa do apoio de amigos ou familiares que morem em outros imóveis, como na reforma do único banheiro da casa, por exemplo, é preciso negociar previamente com eles as condições para este suporte. “Você não pode chegar na casa do vizinho, do irmão ou da sogra de mala e cuia e dizer: “estou em reforma e vou precisar tomar banho aqui todos os dias”. Isso é uma questão de bom senso, de educação”, acrescenta Natal.
Planejar os gastos necessários à execução da obra, deixando uma margem no orçamento para possíveis imprevistos, como um cano estourado no meio da reforma da cozinha, e ampliar o cronograma proposto pelos profissionais responsáveis pela obra são estratégias para evitar surpresas desagradáveis e controlar a ansiedade até o fim da reforma.
A arquiteta Luciana diz que o ideal é que as pessoas saiam do imóvel que vai ser reformado para que não precisem conviver com os transtornos e a sujeira. Quando isto não for possível, definir um cronograma para a entrega dos materiais de acordo com as etapas da reforma contribui para a sensação de limpeza e organização, minimizando o desconforto.
Ainda é preciso definir limites com os profissionais que irão prestar o serviço, como acrescenta Natal. Neles estão itens como o horário de chegada e saída da obra, se eles irão ou não trabalhar nos finais de semana, e como se dará a circulação em espaços mais íntimos da casa, como dormitórios e banheiros, e o uso dos sanitários e da cozinha, por exemplo.
“O comprometimento de todos os envolvidos com a obra também é fundamental. O dono do imóvel precisa ter calma, controle emocional e cumprir o que fidelizou com os contratados para a reforma. O executor, por sua vez, precisa respeitar os horários, a higiene e as etapas da obra”, completa Andréa.
A contratação de um profissional habilitado — arquiteto ou engenheiro —para desenvolver o projeto e acompanhar a execução da obra é outro item fundamental não apenas para garantir tranquilidade aos proprietários durante a execução, mas principalmente a qualidade da reforma.
“Nós assumimos a responsabilidade legal e civil sobre a obra. Além disso, um projeto bem executado poupa custo ao cliente, pois evita retrabalhos e o desperdício de materiais”, lembra a arquiteta Luciana. Segundo ela, o custo total do projeto, incluindo o gerenciamento da obra, gira em torno de 20% do valor total da reforma. “Com os contatos que nós [profissionais] temos, podemos barganhar preços [com os fornecedores] e reduzir o custo com os materiais neste porcentual”, acrescenta.
Criar uma atmosfera amigável e avisar os vizinhos sobre a realização da obra, principalmente no caso de apartamentos, é outra dica para evitar transtornos e sobreviver, sem traumas, à reforma.
Obras devem ser regularizadas na documentação do imóvel
O alvará de construção emitido pela prefeitura não é o único documento que o proprietário do imóvel precisa ter em mãos para dar início à reforma. A Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) ou Registro de Responsabilidade Técnica (RRT), assinado pelo engenheiro ou arquiteto responsável pelo projeto da obra, também precisa estar em dia como forma de se garantir a qualidade e, principalmente, a segurança da edificação que receberá a reforma.
No caso de apartamentos, tais documentos ainda precisam ser apresentados ao síndico do condomínio, que deverá autorizar ou não a realização da obra, como determina a norma 16.280/2014 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), que trata das reformas nas edificações.
“A norma não tem força de lei, mas precisa ser observada. Sempre orientamos o síndico a exigir os documentos [como forma de comprovar] que há um responsável [técnico] acompanhando a obra e que ela não vai trazer nenhuma implicação para a estrutura do edifício”, alerta Arthur Pontes, advogado do Sindicato da Habitação e Condomínios do Paraná (Secovi-PR).
O advogado acrescenta que caso o condomínio passe por uma fiscalização por parte do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Paraná (CREA-PR) ou da prefeitura, eles exigirão os documentos tanto do condomínio quanto do dono do imóvel. Caso os documentos não sejam apresentados, isso pode gerar multa também para o condomínio (o que penalizaria todos os moradores, uma vez que seu pagamento sairia do orçamento do empreendimento) e até o embargo da obra.
Em casos extremos, o síndico e o proprietário do imóvel ainda podem responder civil e criminalmente se houver algum problema decorrente da obra que envolva lesão corporal ou morte, por exemplo.
Registro
Pontes lembra ainda que sempre que a reforma ampliar ou reduzir a área total da construção, ela deve ser averbada no registro do imóvel. Isso porque o documento guarda todas as informações sobre o bem, como o histórico de suas alterações e a área edificada sobre ele. A averbação é feita diretamente no cartório de registro de imóveis.
Saiba quais são as obras mais realizadas nos imóveis curitibanos
LAYOUT DO IMÓVEL
Obras que têm por objetivo renovar ou modificar o layout dos imóveis, por meio da reformulação da planta ou do reposicionamento de móveis, por exemplo, estão entre as mais pedidas pelos proprietários.
Obras que têm por objetivo renovar ou modificar o layout dos imóveis, por meio da reformulação da planta ou do reposicionamento de móveis, por exemplo, estão entre as mais pedidas pelos proprietários.
REVESTIMENTO
A troca do piso e do revestimento de parede, como a substituição de peças “desenhadas” ou do carpete por porcelanatos ou mármores, em especial nas áreas molhadas e de estar, também está no ranking das obras mais solicitadas pelos proprietários dos imóveis.
A troca do piso e do revestimento de parede, como a substituição de peças “desenhadas” ou do carpete por porcelanatos ou mármores, em especial nas áreas molhadas e de estar, também está no ranking das obras mais solicitadas pelos proprietários dos imóveis.
INTEGRAÇÃO
Outra obra que desponta entre os projetos desenvolvidos nos escritórios de arquitetura é a integração de ambientes por meio da derrubada ou de recortes feitos nas paredes. Além de promover amplitude visual aos ambientes, ela potencializa o convívio nas áreas sociais, especialmente quando os proprietários têm por hábito receber amigos e convidados em casa.
Outra obra que desponta entre os projetos desenvolvidos nos escritórios de arquitetura é a integração de ambientes por meio da derrubada ou de recortes feitos nas paredes. Além de promover amplitude visual aos ambientes, ela potencializa o convívio nas áreas sociais, especialmente quando os proprietários têm por hábito receber amigos e convidados em casa.
VARANDA
Integrar a varanda à sala de estar ou dar novos usos para o espaço são outras solicitações comuns entre os moradores dos apartamentos. Brinquedoteca, home office e espaço gourmet estão entre as possibilidades de transformação desta área externa.
Integrar a varanda à sala de estar ou dar novos usos para o espaço são outras solicitações comuns entre os moradores dos apartamentos. Brinquedoteca, home office e espaço gourmet estão entre as possibilidades de transformação desta área externa.
*Agradecimentos: Hélio dos Santos Nocente, Thasio da Silva Malrecy e Leroy Merlin.