Arquitetura
Novo café em Milão vira sensação com arquitetura e design de 1950
Fotos: Michele Nastasi/Divulgação | Michele Nastasi
Há quem se surpreenda ao contemplar através de um ângulo insólito o quadro “O beijo”, do italiano Francesco Hayez, pintado em 1859, um dos símbolos da Pinacoteca de Brera, em Milão. A nova perspectiva não faz parte de nenhuma artimanha do principal museu da cidade. Muitos menos de uma instalação rocambolesca. É simplesmente que há uma passagem lateral que comunica a cafeteria, inaugurada no ano passado, a duas salas da instituição cultural.
A antiga bilheteria, projetada pelo arquiteto Piero Portaluppi, após os bombardeios da Segunda Guerra Mundial, passou por uma reforma de 4 meses e ganhou uma nova incumbência: oferecer aos visitantes a oportunidade de degustar um bom café ou uma rápida refeição em um ambiente que, na verdade, é uma extensão do museu. “É um espaço integrado que conta com alguns quadros e esculturas. Uma mini galeria. E daqui, continuamos ainda a admirar obras-primas de modo inusitado, principalmente quem se senta nas proximidades das portas laterais”, explica Giuliano Iamele, do escritório rgastudio, responsável pela transformação arquitetônica.
O Caffè Fernanda é uma homenagem a Fernanda Wittgens, visionária diretora da Pinacoteca de Brera que, em 1950, reabriu as portas do museu. Poucos sabem, mas a italiana teve papel fundamental na conservação de parte do acervo durante os anos de guerra. Foi ela quem determinou que as peças fossem transportadas para abrigos.
E por isso mesmo serviram de inspiração para conceber o novo layout do bar e bistrô que se mostra em perfeita sintonia cromática e arquitetônica com as demais dependências do museu. “A exigência era que o Caffè Fernanda fizesse parte do percurso cultural da Pinacoteca e seguisse o mesmo conceito de design implementado nas outras 38 salas”, esclarece o arquiteto italiano que manteve intacto o esplêndido piso de mármore ‘Fiore di Pesco’ em tons de bege, marrom e alaranjado, e as molduras das portas laterais de mármore escuro ‘Rosso Levanto’. “São materiais herdados do projeto original de Piero Portaluppi que foram recuperados e restaurados.”
A concepção decorativa soturna dos espaços expositivos da instituição se repete no ambiente do café, apesar das duas grandes janelas laterais. As paredes foram pintadas de um intenso azul esverdeado que contrasta elegantemente com os tons quentes das demais salas da Pinacoteca de Brera.
“O ponto focal do bar/bistrô é a enorme tela ‘La Conversione del Duca d’Aquitania’, de Pietro Damini, realizada em 1619. Posso dizer que a inspiração partiu dali. A moldura dourada do quadro nos levou a utilizar o bronze em boa parte do balcão, estilo anos 50, e que foi revestido externamente em nogueira maciça”, descreve o arquiteto responsável pelo projeto que se valeu de espelhos nas prateleiras que acomodam as bebidas do bar e ainda refletem a escultura ‘Amore e le Tre Grazie’, do dinamarquês Graziedel Thordvalsen, e o retrato da ex-diretora italiana pintado por da Attilio Rossi.
Para iluminar o ambiente, que tem apenas duas janelas, foram instalados trilhos com spots, sistema muito usado em museus. O mobiliário é bem ao estilo vintage. As cadeiras e mesas em madeira — sempre nogueira — com detalhes em bronze. As poltronas, posicionadas na parte lateral, foram revestidas em couro sintético na cor rosa.
“É o toque feminino em um projeto tão austero. Um tributo à grande mulher que era a diretora da Pinacoteca”, revela Giuliano Iamele que, no terraço externo, optou por móveis mais leves nas cores azul celeste. “Fernanda Wittgens inovou o modo como se visitar um museu. Introduziu itinerários feitos sob medida para crianças e até concertos musicais dentro das salas de exposição. O Caffè Fernanda é refinado, moderno e acolhedor. Exatamente como era a sua diretora.”
Veja mais fotos do novo espaço gastronômica da Pinacoteca de Brera:
*Especial para a Gazeta do Povo, de Milão, na Itália.