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Arquitetura
Conheça José Maria Gandolfi, um dos arquitetos mais importantes do Brasil
Na foto um dos grandes nomes da arquitetura no Brasil , José Maria Gandolfi . | Letícia Akemi
A árvore aí em frente da sua casa ou do seu prédio muito provavelmente deve a sua existência a José Maria Gandolfi, 87 anos. O arquiteto foi a pessoa que mais plantou árvores na capital paranaense. Aproximadamente 350 mil, de 1971 a 1974, quando liderou a Diretoria de Praças e Parques de Curitiba, a convite do então prefeito Jaime Lerner. Uma média de 87,5 mil plantas por ano. Essa é uma das conquistas mais singelas que o arquiteto paulista de família italiana de Salerno e da Bolonha faz questão de lembrar.
Na verdade, Gandolfi é frequentemente lembrado por diversas outras razões que atestam seu pedigree. Fez parte da gangue de arquitetos paulistas que veio lecionar na primeira turma do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Paraná, na década de 1960. Entre seus pupilos, o próprio Lerner, Manoel Coelho e Lubomir Ficinski Dunin, para citar apenas alguns. Ajudou a criar o internacionalmente famoso Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (Ippuc). E, junto do irmão Roberto Gandolfi e do sócio Luiz Forte Netto, fundou o lendário escritório Forte Gandolfi, que de 1962 a 1973 deu vazão a grandes obras pelo Brasil.
Sua criação mais conhecida é o edifício sede da Petrobras, no Rio de Janeiro, construído entre 1966 e 1967. Dos 37 concursos públicos de arquitetura em que foi premiado, em 22 deles teve sua proposta em 1º ou 2º lugar. Entre suas principais obras, estão a sede do Jockey Clube de São Paulo, sede do Santa Mônica Clube de Campo, na época o maior clube de campo da América Latina; sede do Clube Curitibano, ginásio do Círculo Militar, edifício da Paraná Previdência, entre tantos outros edifícios modernos de Curitiba espalhados pelo Cabral, Batel e Alto da XV.
Todas essas obras com um DNA em comum: a arquitetura brutalista paulista, com integração das funções em um único bloco, horizontalidade, primazia das linhas retas, superfícies rugosas em concreto aparente, predominância dos cheios sobre os vazios, iluminação natural e uso de vigas-calha, como atesta a arquiteta Michelle Schneider Santos, em seu trabalho de mestrado “A arquitetura do escritório Forte Gandolfi” na Universidade Presbiteriana Mackenzie.
Sem medo de se aventurar
Avesso a entrevistas e mais adepto do estilo low-profile, o arquiteto de rosto esguio e topete Rockabilly vive hoje na cobertura de um dos prédios que projetou no Cabral. Apesar da decoração modernista e madura, a sobriedade é quebrada por diversos ursinhos de pelúcia espalhados pelo apartamento. De todas as cores e tamanhos, de olhos brilhantes e redondinhos como jabuticabas. É uma das coisas que ele mais gosta de ganhar de presente. Fica a dica. E isso já revela que, ao contrário do que se pode esperar, Gandolfi é um mister simpatia. Adora papear.
Tomou gosto pela arquitetura ao ajudar o pai em diversos serviços de faz tudo. Aprendeu a pintar, a mexer com a madeira, a consertar qualquer coisa que fosse. Gostou de comprar ferramentas e de resolver problemas. “E para ser um bom arquiteto tem que saber resolver problemas”, assegura. E dá outra dica para o sucesso: “50% é projeto, e 50% é estar na obra.”
Formou-se em Arquitetura na Universidade Mackenzie, em São Paulo, e, depois de juntar um dinheiro colaborando junto dos arquitetos Carlos Millan e Jorge Wilheim, decidiu viajar pela Europa por um ano inteirinho. Sua meta era utilizar apenas 3 dólares por dia. A doideira deu certo. Chegou até a ficar amigo de Giuseppe Di Stefano, um cantor de ópera famosíssimo de Milão que, mais tarde, ficou conhecido como “A Voz de Ouro”. “A gente discutia como no futebol”, relembra.
Mas suas doses de aventura não acabaram por aí. Gandolfi também ficou bem próximo de Roberto Burle Marx, o inventor dos jardins modernos. Adorava ouvir os palpites do amigo sobre os projetos. E de comer sua comida nos banquetes inesquecíveis que o paisagista dava no sítio Santo Antônio da Bica, em Pedra de Guaratiba, na zona oeste do Rio. Foi graças a essas dicas que as árvores da cidade pararam de ter aquelas pinturas brancas em seus troncos. “Ele ficou louco quando descobriu isso. Perguntava-se por que as pessoas queriam colocar polainas nas árvores.”
O mestre ainda está na ativa do próprio escritório, mas cada vez mais tem se dedicado a seus hobbies. É fã de carteirinha da soprano italiana Renata Tebaldi, uma das maiores cantoras de ópera da história. Curte fotografia e mexer com as plantas. Ultimamente tem quebrado a cabeça para projetar novas floreiras para seu apartamento e para a chácara da família. E, na ausência de poder bater perna por aí, fotografa imagens da TV mesmo. Grava alguns programas, para na cena que deseja, põe a máquina no tripé e manda bala. Ninguém diz que é uma imagem da imagem.