Reforma
Arquitetura
Edifício da Procuratie Vecchie de Veneza abre ao público pela primeira vez após reforma
Foram necessários cinco séculos e cinco anos de uma completa reforma para que os italianos e turistas que passam por Veneza pudessem conhecer um dos conjuntos arquitetônicos mais famosos e admirados da cidade: a Procuratie Vecchie. O icônico edifício foi sede da Procuradoria da Sereníssima, como é conhecida a cidade, e abrigava os procuradores da república local. Erguido no século XVI, a obra foi destruída por um incêndio e o novo complexo que se estende por 152 metros, em estilo clássico, foi inaugurado em 1640, com seu emblemático pórtico com 50 arcos e 100 janelas com vista para a Praça San Marco. Em 1832, o edifício foi comprado pela Assicurazioni Generali, a maior companhia de seguros da Itália e uma das maiores da Europa até 1989, que ali instalou sua sede. Abandonada por anos, a Procuratie Vecchie passou por uma completa reforma nos últimos cinco anos como parte de um projeto de reurbanização da área de Marciana, financiada pela seguradora italiana.
A inauguração aconteceu em abril deste ano. O arquiteto David Chipperfield foi o responsável pelo restauro interno e o projeto de design de interiores é do escritório Migliore + Servetto, de Ico Migliore e Mara Servetto. Em menos de seis meses, a Procuratie Vecchie tornou-se um dos mais visitados pontos turísticos de Veneza. São 12.400 metros quadrados distribuídos em três andares, onde materiais como marmorino, pisos venezianos e mármore nos tons de branco e bege são protagonistas. Nos primeiros dois andares ficam os escritórios da seguradora, espaços destinados a galerias, um auditório para 300 pessoas e um terraço de onde se pode admirar a cidade.
No terceiro e último andar, com suas janelas desenhadas pelo arquiteto Jacopo Sansovino, no século XVI, está a sede da ONG The Human Safety Net Foundation, que dá apoio a pessoas em situação de vulnerabilidade, como refugiados. Os espaços internos foram concebidos pelo escritório Migliore e Servetto com o objetivo de criar uma área de interação e diálogo: salas de coworking e eventos reservadas às atividades da fundação e seus parceiros e uma cafeteria com preços mais populares. “O projeto da The Human Safety Net é um emblema da forte identidade cultural e hospitalidade de Veneza", explicam os arquitetos responsáveis pela reforma interna da sede. "Temos três símbolos recorrentes que se conectam nesta obra: a mesa, o ninho e o espelho. A mesa é o ponto de encontro e do diálogo, e está presente nas instalações interativas e nos espaços comuns. O ninho é o símbolo da hospitalidade e do vínculo e é lembrado nas estruturas das bibliotecas. E, por último, o espelho, que é a alegoria do confronto consigo mesmo, da reflexão, da consciência".
A referência ao estilo veneziano é evidente em cada metro quadrado, seja com seus conteúdos e materiais, seja graças à colaboração com alguns artesãos locais. "As raízes venezianas são evocadas nos materiais -- madeira, cordas, vidro, cobre, espelhos -- utilizados para criar o mobiliário que desenhamos especialmente para as áreas comuns, a cafeteria e o espaço dedicado às exposições", complementam Ico Migliorato e Mara Servetto, que optaram por tijolos à vista nas paredes e enormes traves de madeira no teto. Diversas ilhas tecnológicas com máquinas ópticas permitem que os visitantes mergulhem na vida da cidade, uma nova forma de interação. Destaque para a instalação "Janela sobre Veneza", um verdadeiro túnel do tempo que possibilita explorar em 3D alguns pontos de Veneza no século XVI, como a Giudecca, a Ponte Rialto, o Arsenale e as ilhas de Burano e Murano.
A "venezianità" cultural e arquitetônica também são visíveis, por exemplo, nos bancos de madeira natural da cafeteria, que são os mesmos usados nos históricos bares venezianos. Os lustres de vidro de Benvenuto Mastri Vetrai foram pensados para dialogar com a luz natural do edifício e o legado de Veneza, com o teatro e as máscaras se revelando na instalação "Teatro Veneziano", uma ideia de David Rampello. As marionetes, criadas pelo Atelier Colla, interagem com o público e respondem dúvidas sobre a história da cidade em diversos idiomas. "Nosso objetivo foi o de transformar a 'casa' da fundação em um local acolhedor, um verdadeiro ninho de proteção contemporânea", concluem os arquitetos.