Arquitetura
Casa Lerner: espaço que abrigou judeus refugiados da Segunda Guerra será restaurada em Curitiba
Foto: Haraton Maravalhas/Casa da Memória
Um chamativo tapume colocado em frente à casa de número 407 da rua Riachuelo, quase em frente ao recém-inaugurado Cine Passeio, anuncia o fim do período de abandono do prédio – que já dura anos. Conforme sinaliza, a Casa Lerner, que recebeu esse nome em homenagem a Dora e Israel Chaim Lerner, conhecido como Jaime, proprietários do local durante aproximadamente 40 anos, é um dos imóveis a ser recuperado pelo projeto Rosto da Cidade, idealizado pela Prefeitura de Curitiba e que prevê a revitalização urbana de alguns pontos icônicos da cidade.
Nesse caso, porém, a expectativa é de que a casa passe por mais do que limpeza e pintura, conforme diz o programa. A recuperação ali deverá ser mais significativa, não apenas por necessidade – há relatos da
precariedade da situação publicados pela Gazeta do Povo desde pelo menos 2010, mas também porque a casa deverá ser incorporada ao patrimônio da prefeitura para ser transformada em um espaço cultural sob responsabilidade da Fundação Cultural de Curitiba (FCC).
precariedade da situação publicados pela Gazeta do Povo desde pelo menos 2010, mas também porque a casa deverá ser incorporada ao patrimônio da prefeitura para ser transformada em um espaço cultural sob responsabilidade da Fundação Cultural de Curitiba (FCC).
De acordo com a assessoria de imprensa da FCC, o imóvel está em processo de desapropriação, o qual começou em outubro de 2018, após a publicação no Diário Oficial do município de decreto que transformava a casa em bem de utilidade pública. O órgão não informou em quanto tempo esse processo deve ser finalizado.
Quanto aos projetos de restauro e uso do espaço, a FCC afirmou que eles ainda estão em desenvolvimento e devem ser apresentados quando a desapropriação for finalizada. O que se sabe até o momento é que ele sediará “uma nova unidade cultural, a qual deverá se integrar aos equipamentos culturais já existentes nas proximidades, como Cine Passeio e Solar do Barão”.
Belle Époque
Quem viu a Casa Lerner pouco antes da instalação do tapume da prefeitura, já bastante deteriorada pelo tempo e o abandono, dificilmente vai usar termos como euforia ou progresso para falar dela. Contudo, são essas as palavras associadas ao período e estilo que ela representa: a Belle Époque, aqui fortemente ligada ao ciclo da erva-mate.
À época – uma pesquisa da Casa da Memória indica que o imóvel foi erguido na década de 1910 –, havia uma euforia relacionada ao progresso e à cultura, o que se refletia em uma arquitetura “celebrativa” e “extrovertida”. Entre as características da casa que se relacionam com o estilo adotado naquele momento estão o porão alto, as escadarias conduzindo à entrada principal, os detalhes ornamentais no gradil de ferro e as grandes janelas de frente para a rua.
Mas não foi só por isso – ou pelo fato de ser um residência em meio aos muitos sobrados comerciais da via – que a casa se tornou importante: enquanto foi propriedade dos Lerner, o local se tornou um ponto de encontro da comunidade judaica. Depois da morte do casal, no entanto, o local foi vendido para comerciantes da região e, mais tarde, levado a leilão devido a um processo trabalhista contra um antigo proprietário. Mesmo tendo sido adquirido por um microempresário em 2004, a residência acabou fechada e abandonada à ação do tempo.
Os Lerner
Os Lerner Dora e Israel Chaim eram judeus que vieram ao Brasil na década de 1930, assustados com o avanço do antissemitismo. De acordo com reportagem escrita por José Carlos Fernandes e publicada na Gazeta do Povo em julho de 2010, ao chegarem aqui, foram acolhidos pelo industrial Salomão Guelmann, da Móveis Guelmann, que ficou conhecido por abrigar judeus perseguidos na Europa, e abriram uma lavanderia na rua Cruz Machado em parceria com Rosa e Abraham, irmã e cunhado de Dora.
Alguns anos mais tarde, com o fim da sociedade, Israel e Dora abriram a Casa Paris, na Praça Tiradentes. Os rendimentos do novo negócio permitiram então que o casal comprasse o que considerava “a mais bela casa da Riachuelo”. Ali, o casal criou alegre e abundante refúgio judeu em meio a um
conjunto de comércios majoritariamente sírio-libanês, onde, de acordo com os herdeiros Geni Wilner e Bernardo Rzeznik, havia lanches e reuniões – e mais do que isso: abrigo e afeto para enfrentar o difícil período da Segunda Guerra Mundial.
conjunto de comércios majoritariamente sírio-libanês, onde, de acordo com os herdeiros Geni Wilner e Bernardo Rzeznik, havia lanches e reuniões – e mais do que isso: abrigo e afeto para enfrentar o difícil período da Segunda Guerra Mundial.