Contra modismos
Arquitetura
“Arquitetura icônica é termômetro de um momento e não nos identificamos com isso”, critica Carme Pigem

Catalã, Carme Pigem foi a terceira mulher a receber o Pritzker pelo trabalho realizado junto ao RCR Arquitectes. | Pep Sau
Na manhã desta terça-feira (20), a UIA2021RIO (27º Congresso Mundial de Arquitetos) exibiu uma entrevista exclusiva com os arquitetos catalães Rafael Aranda e Carme Pigem, sócios fundadores do RCR Arquitectes, que, em conjunto com Ramon Vilalta, recebeu em 2017 o Pritzker, a maior honraria da arquitetura.
Na conversa, a dupla de arquitetos frisou que não faz edifícios, mas constrói paisagem. E por isso consideram a arquitetura icônica, encarada como um objeto que é colocado em determinado lugar, como um modismo. "E não nos identificamos com isso", criticam.

Carme também explicou que é a favor de um entrelaçamento mais forte entre interior e exterior. "Vivo na minha casa e saio para me divertir. Por que deve ser assim? Temos que quebrar as fronteiras, e isso sempre foi prioridade para nós", compartilha a arquiteta catalã.
Aranda vai além e complemente: "Olhe o ar-condicionado, por exemplo. Antes as pessoas confiavam nas correntes de ar para ventilar. Agora usam ar-condicionado para não sentir calor no verão. Por quê não podemos sentir calor no verão? É o natural. O estranho é sair de um espaço de 50 graus e entrar em um em que você passará frio", explica Aranda.

Ainda segundo os arquitetos, a arquitetura global que se vê hoje em dia vive uma repetição de modelos que não considera o que já pré-existia no local, como técnicas, materiais, comunidades, paisagens. "Não nos interessa essa globalização formal. O que nos interessa é falar da essencialidade, que é uma linguagem universal, mas se manifesta de formas diferentes nos lugares do mundo", frisa Carme.
"Fomos procurados pela Arábia Saudita para fazer um projeto. Mas a gente se deu conta que esse não é nosso caminho. Não nos sentimos confortáveis. Não nos identificamos com a arquitetura icônica. É um termômetro de um momento", desafia a dupla durante o bate-papo informal em seu próprio escritório, fundação e laboratório na pequena cidade de Olot, no interior da Espanha. "Essa fórmula é de objetos colocados lá. Não nos interessa sem cultura e sem ligação com o lugar."

Questionados sobre a sustentabilidade, os arquitetos levantaram diversas questões importantes. "Sustentabilidade é algo claro sobre materiais e sua procedência, derivados ou reciclados. Diria que teria que ser 70% da construção oriunda disso. Depois observe o consumo de energia e onde o usuário estaria disposto a parar de consumir. Teria que ser 80% do total. E fechar com uma intervenção respeitosa na paisagem", opinam.
E discorreram sobre La Vila, um espaço que estão criando para que "as pessoas possam sentir que é possível sonhar", em suas próprias palavras. Esse lugar é como um laboratório de experimentação, em que eles começam a construir como se a humanidade tivesse dado um passo para trás e tratado o ambiente de forma diferente desde o começo, com intervenções inteligentes.

O UIA2021RIO segue até a próxima quinta-feira (22) em formato 100% digital. As inscrições estão abertas. Mais informações podem ser obtidas no site oficial do evento. A entrevista pode ser revista por quem já está inscrito na plataforma. Ela permanecerá disponível por dois anos, segundo informações dos organizadores do evento.