Arquitetura
8 propostas contemporâneas e polêmicas para a estrutura de Notre-Dame destruída pelo fogo
Proposta de nova torre (pináculo) para Notre-Dame pelo designer francês Mathieu Lehanneur. Foto: Instagram/Reprodução
Desde a catástrofe que atingiu a Catedral de Notre-Dame, em Paris, no último dia 15, e desde o anúncio de um concurso internacional organizado pelo governo francês para um novo desenho para a cobertura da igreja gótica francesa, diversos escritórios de arquitetura e design pelo mundo publicaram propostas independentes.
Considerada Patrimônio Mundial da Humanidade pela Unesco, a catedral de 856 anos sofreu grandes danos quando o fogo destruiu sua torre central e dois terços de sua cobertura, bem como partes de seu interior. A construção da catedral, que é tida como um dos melhores exemplos da arquitetura gótica na Europa, começou em 1163. Sua antiga estrutura, composta por 1.300 elementos de madeira, foi apelidada de “Floresta”.
Confira as propostas mais ousadas publicadas nas redes sociais e entenda porque elas são controversas!
Studio Fuksas
Os arquitetos italianos Massimiliano e Doriana Fuksas propuseram uma cobertura contemporânea e um pináculo feitos a partir de cristais Baccarat, que poderiam ser iluminados durante a noite, criando um efeito especial. “Um símbolo de cristal da fragilidade da história e da espiritualidade. Luz como um símbolo da imaterialidade”, descreve o escritório.
Mathieu Lehanneur
O designer francês sugere não uma réplica do pináculo de 150 anos, mas uma escultura do que se via no momento do incêndio. “De uma maneira provocativa, eu propus reconstruir a torre da maneira como ela era, seguindo os mais conservadores: como ela era na semana passada!”
Para o designer, trata-se da ideia de embalsamar um momento histórico, tornando uma catástrofe bonita. Por isso a chama permanente dourada, para nos lembrar do efêmero e da impermanência.
Vizumatelier
Com base na Eslováquia, o escritório de Vizumatelier sugere uma torre iluminada com um farol no topo, direcionando uma luz única para o céu. “Na época das construções góticas, os arquitetos tentavam alcançar o céu. Viollet le Duc tentou o mesmo no século 19. Agora é possível fazer isso acontecer”.
Kiss The Architect
O escritório colaborativo propuseram uma estrutura monumental, beirando o kitsch, com um mix de elementos geométricos.
AJ6 Studio
O escritório paulistano reimaginou Notre-Dame com uma cobertura feita inteirinha de vitrais. “No estilo gótico existe a conexão entre céu e terra, e dentro da catedral, a iluminação natural se multiplica em cores através dos vitrais”.
Alexander Nerovnya
O arquiteto russo Alexander Nerovnya pensou em uma cobertura tradicional de vidro, para destacar a conexão entre história e modernidade.
David Deroo
O artista e arquiteto francês David Deroo criou um uma representação ideal e modernizada do pináculo reconstruído. “Um meio termo deveria ser alcançado na discussão entre reconhecer o passado e incorporar inovação.”
Studio NAB
Os arquitetos do Studio NAB desenvolveram uma cobertura-estufa, com direito a uma vista privilegiada da cidade, e até um espaço para apiários no pináculo.
Reconstruir ou reinterpretar?
O escritor inglês Theodore Dalrymple talvez seja uma das vozes mais contundentes na crítica ao concurso internacional de arquitetura anunciado pelo primeiro-ministro Édouard Philippe. Em artigo recente, defende que o narcisismo dos arquitetos estrelinhas pode prejudicar a arquitetura da catedral francesa (veja a publicação aqui).
A arquiteta Rosina Parchen, uma das autoridades máximas em patrimônio e restauro do Paraná, levanta a bandeira pela reconstrução da torre principal e da cobertura original. Com a experiência de décadas à frente da Coordenação do Patrimônio Cultural (CPC) do Paraná e atualmente como conselheira da região Sul do Conselho Internacional de Monumentos e Sítios (Icomos, na sigla em inglês), ligada a Unesco e sediada em Paris, Rosina lembra que mesmo o pináculo não sendo original, estava lá há muito tempo e faz parte da imagem histórica e emotiva da catedral.
O pináculo em questão não faz parte do projeto original da catedral, que foi construída entre os séculos 12 e 13. A primeira estrutura do tipo foi incluída somente entre os séculos 13 e 18. A mais nova era assinada pelo arquiteto francês Eugène Viollet-le-Duc, e foi construída com mais de 90 metros durante o restauro do século 19.
“É uma questão polêmica e discutida pelos teóricos até hoje. Os elementos, mesmo não originais, se incorporam aos edifícios. Como atesta a Carta de Veneza, um dos instrumentos internacionais mais importantes do patrimônio e restauro, os acréscimos, desde que não comprometam o edifício, devem ser respeitados numa restauração“, explica. “Devemos respeitar a intervenção do Duc.”
“A estrutura da catedral é muito bem documentada. Não tem porque não ser recuperada”, justifica. Questionada sobre a comparação com o Museu do Louvre e sua pirâmide contemporânea, ela esclarece: “É uma outra situação. O museu é um edifício imenso, bastante alterado. Por isso havia a necessidade de marcar onde era a entrada do Louvre.”
E Rosina lembra: “Por ser considerado um patrimônio da humanidade, qualquer intervenção não poderá ser feita sem o aval do Centro de Patrimônio da Unesco. “Pela minha experiência, acho que os especialistas não vão ceder à intervenção. Eles são de uma abordagem mais conservadora”, frisa.