A construção arquitetônica de um imóvel é algo que implica em muitos aspectos que vão além do simples desenho da estrutura, e pode impactar significativamente na valorização do bem (ou o contrário). Da mesma forma, o conjunto arquitetônico e o desenho urbanístico de uma cidade é algo que auxilia na composição de preço de uma região. Dentro desse tema, a coluna traz uma entrevista com Gustavo Scaramella, compartilhando sua visão sobre o assunto e reforçando sua opinião de que projetos com personalidade são mais necessários em Curitiba, principalmente para evitar o “lugar comum”, posição que nossa cidade não gosta de estar, e que pode depreciar o mercado imobiliário. Gustavo é arquiteto formado pela UFPR (Universidade Federal do Paraná) e atua no mercado com escritório próprio há 10 anos. Já contabilizou participações na CASACOR PR e SP e busca deixar como legado a personalização máxima de cada projeto.
Hadassa Bonin: Como você vê a realidade, em termos de projetos arquitetônicos dos empreendimentos imobiliários e imóveis em geral, na cidade de Curitiba?
Gustavo Scaramella: Vejo Curitiba um pouco estagnada, parada no tempo. É urgente que se abram os olhos para novas formas de viver, de projetar. Independentemente de estilo, buscar mais personalidade e qualidade. Reproduzir e pasteurizar menos o morar, menos empreendimentos e casas que tenham cara de qualquer um. Essa busca por agradar tem nos levado a lugar nenhum.
HB: A parte da sustentabilidade é cada vez mais importante nos projetos de imóveis hoje em dia. De que forma você enxergar esse movimento?
GS: Tecnicamente, vejo que sustentabilidade é essencial em qualquer projeto. Mas acredito muito que a busca por qualidade e identidade tenham um poder gigante nisso. Escolhas boas e certeiras seguem bem ao longo do tempo, geram menos impacto no meio ambiente, pois não são descartáveis. Costumeiramente, bons materiais podem ser reutilizados, receber novos tratamentos e acabamentos.
HB: O uso de obras de arte nos lançamentos imobiliários vem ganhado destaque na cidade de Curitiba. Quais as suas considerações a respeito deste movimento?
GS: Como em tudo, devemos expandir os horizontes. É, sim, interessante apoiar e dar palco para artistas locais, mas não podemos nos limitar a isso para que tantos espaços não acabem ganhando a mesma atmosfera. Se o intuito é agregar valor através do uso de arte, vejo que as escolhas devam fazer parte do conceito geral e começarem no início do projeto. Podemos, assim, adequar os espaços para dar destaque a essas peças e não as utilizar apenas como complemento.
HB: Você acredita que a presença de arte pode valorizar significativamente um empreendimento? Há algum exemplo específico em que uma obra de arte tenha transformado a percepção de um espaço?
GS: Definitivamente! Considerando um cenário ideal em que o espaço é feito com boa arquitetura e, por conta disso, com uso correto de materiais, a maneira mais interessante de se elevar e criar interesse em um espaço é através de arte. Por que não investir em arte ao invés de forrar tudo com mármores importados, lustres de gosto duvidoso e marcenarias desnecessárias quando se pode escolher uma obra importante para fazer parte do acervo do empreendimento? Pode-se vestir um ambiente com arte. Um mix de artistas renomados, de jovens talentos e mesmo de peças meramente decorativas. É necessário, é claro, olho treinado para tal tarefa. O hall do edifício Dsenho é um exemplo interessante, com ares de galeria obras de arte e mobiliário vestem o espaço, geram curiosidade e o tornam único, é a escolha do "recheio" sobre uma base limpa e bem resolvida que traz caráter ao espaço.
HB: Falando de materiais, quando você seleciona o que será utilizado para um projeto, quais são os principais fatores que influenciam sua escolha?
GS: Em primeiro lugar, vem a função. Após isso, estética e qualidade. Para mim, o fator da sustentabilidade é muito ligado a materiais que enfrentem bem a passagem do tempo, envelheçam com dignidade. Sempre buscar trabalhar com materiais reais. Se for para parecer madeira, que seja madeira. Se for para parecer mármore, que seja mármore. Se for para parecer cerâmica, que seja cerâmica. Destaco mais uma vez os materiais que carregam verdade, naturais com cara de naturais, como madeira, mármores, granitos, ou, artesania presente nas cerâmicas com cara de cerâmica, ladrilhos hidráulicos, pastilhas e, ainda, metais, como inox, latão e cobre, explorando sua diversidade de acabamentos.
HB: Como a escolha de materiais pode impactar o valor percebido de um empreendimento e o seu preço final?
É necessário cuidado ao buscar seguir tendências e desejos de mercado, pois quando assim fazemos, pode-se optar por escolhas duvidosas, que prezam apenas pela busca de efeito. Acredito que, a curto e médio prazos, isso tende a desvalorizar os imóveis. A falta de personalidade e qualidade na escolha dos materiais é um ponto que vejo como desvalorizador. Acredito também que o equilíbrio é uma fórmula feita de oitos e de oitentas e que, quando bem explorados, quaisquer materiais que sejam reais podem garantir um resultado incrível e influenciar positivamente no valor de um imóvel.